As 607 ações judiciais que restaram arquivadas, relativas às mortes investigadas por ausência de internação hospitalar, desde meados de 2009, podem ser objeto de nova apuração, mas no âmbito político. O vereador Eduardo Borgo, da Comissão de Saúde, disse hoje que está protocolando pedido de abertura de Comissão Especial de Inquérito (CEI) para depurar os processos que analisaram os casos da crise hospitalar na cidade. Para ir a plenário o pedido precisa de 6 assinaturas e 9 para a apuração ser aberta.
Conforme o parlamentar, o pedido de apuração tem relação com o passado e o presente. “Eu levantei todos os dados. Na ocasião, a sequência absurda de mortes em Bauru em razão da crise hospitalar por ausência ou falta de leitos de internação foi objeto de inquérito presidido pelo então delegado Kleber Granja. Por ser conteúdo especializado, todos os 507 inquéritos vieram com laudos e o relatório conclusivo trouxe relação entre os óbitos e a deficiência na oferta de internação”, conta.
Contudo, aponta Borgo, os inquéritos geraram 607 ações sob segredo de Justiça. “E em todos os casos houve arquivamento com base na ausência de nexo causal, ou seja de relação, entre as mortes e a falta de internação ou de leitos. Eu levantei os processos e neles constam os laudos periciais realizados com apontamento diferente do que trouxeram os laudos do inquérito. Vivemos a continuidade de uma crise hospitalar e com agravamentos recentes, seja pela Covid seja agora pela dengue. Mas as filas permanecem gigantes e as pessoas morrendo”, aborda.
Neste mês, a Comissão de Saúde ouviu da Secretaria Estadual da Saúde que não há orçamento para abrir, de fato, o HC (que está com não mais que 30 leitos funcionando, de forma parcial). O governo estadual (anterior) prometeu, por mais de uma vez, recursos para abrir a unidade. Há anos o HC está pronto e sem funcionamento. E o Ministério Público não ingressou com ação civil para responsabilização dos agentes políticos e administrativos pela situação de inércia (e desídia), por anos.
Borgo disse que o pedido de CEI quer apurar desde 2009. “Fiz o levantamento completo dos casos desde 2009. Passados todos estes anos, continuamos tendo mortes. Neste início de 2023, mais mortes de pacientes enquanto aguardavam internação. O pedido é de 2009 até esta data, março de 2023. Não podemos deixar todos esses casos sem apuração. Nossa obrigação é fiscalizar”, antecipa.
No meio político, de outro lado, circulam conversas preliminares para abertura de CEI para outros objetos, como as deficiências de materiais, insumos, na Secretaria Municipal de Saúde. Outra apuração está em curso no âmbito da Comissão de Fiscalização, relativa ao contrato e aditivo da Secretaria de Saúde firmado com a entidade AHBB, de Lins, para plantões médicos.
O próprio governo municipal, neste caso da AHBB, confirmou que antecipou valores, por pelo menos dois meses, para a empresa formar caixa para cumprir o contrato. A Secretaria também contou, em audiência, que manteve pagamentos e ainda assinou um segundo contrato com a AHBB, mesmo tendo relatado que a entidade não cumpriu a prestação de contas. A AHBB questiona os apontamentos e diz que a Prefeitura é quem deve para ela.
O governo municipal ingressou com ação judicial de cobrança contra a entidade.
TRÊS ANOS DEPOIS
O início oficial da pandemia em Bauru foi em um 20 de março de 2020, com decreto do então prefeito Clodoaldo Gazzetta. Três anos depois, conforme os boletins oficiais da Covid emitidos pela Prefeitura de Bauru,172 bauruenses faleceram enquanto estavam sendo atendidos por serviço municipal de Saúde, aguardando leitos UTI pelo Estado.
O levantamento do CONTRAPONTO foi realizado na descrição dos óbitos informados pelo Município. Todos os boletins oficiais informam se o óbito aconteceu enquanto a pessoa estava em unidade particular ou “serviço público”. Muitos dos 172 casos foram do período mais trágico, em 2021, com dezenas de óbitos sendo registrados no Posto Covid, ao lado do Pronto-Socorro.
MAIS DUAS MORTES
Neste início de ano, foram registradas duas mortes de pacientes, enquanto aguardavam internação pelo Estado em UPAs. Um dos casos é de uma menina de 9 anos, da semana passada. O segundo óbito aconteceu na madrugada desta sexta-feira para sábado. Os dois casos foram informados como suspeita de dengue.
O paciente Anderson Luiz Parilha Garcia, 66 anos, deu entrada antes do sábado, na UPA do Ipiranga. O CONTRAPONTO foi acionado por amigos d Anderson, no sábado, desesperados com a piora de seu quadro de saúde e a permanência na espera por internação. Ele faleceu na madrugada.
Infelizmente é evidente a falta de procedimento por parte dos órgãos que administram à saúde nos âmbitos municipal e estadual e a prevaricação do MP em buscar esclarecimentos e justiça chega a ser conivência.