Caso Pamplona: juiz anula todos os registros em Agudos porque loteamento é em Bauru

O Pamplona Residencial foi aprovado e registrado como sendo em Agudos. A Justiça enfim manda anular os documentos e refazer em Bauru

O Judiciário, enfim, decide que a gleba de 500 mil metros quadrados onde foi aprovado e instalado o Pamplona Residencial, na divisa com Agudos, pertence ao Município de Bauru. O juiz do Fórum da cidade vizinha, Maurício Martines Chiado determinou, em 6 de maio deste 2024, a anulação de todas as matrículas e atos de registro do loteamento e a providência de efetivação de cada lote do empreendimento em Bauru.

A decisão está em procedimento administrativo solicitado pelo Ministério Público ao juiz Corregedor do Registro de Imóveis da Comarca de Agudos. A medida vem depois de anos de espera. A discussão em torno da localização do Residencial, às margens do Rio Batalha, envolve processos de natureza ambiental, de registro imobiliário, prejuízos, danos a terceiros e fraude (inclusive cartorial).

Inicialmente, o processo foi iniciado, em uma das frentes, em razão de denúncia em relação a Área de Proteção Ambiental (APA) onde está inserida o loteamento. O parcelamento de solo contou com a aprovação em Agudos. A partir disso, de outro lado, o Ministério Público Federal em Bauru (SP) passou a apurar que a localização (com laudo cartográfico) dos 400 lotes é em Bauru. ,

Decorrente de toda a discussão, vieram várias medidas judiciais, por crime, fraude e pedido de ressarcimento. Até aqui, os proprietários ainda aguardam desfecho no Judiciário. Enquanto isso, é a primeira decisão, com efeito para todos os envolvidos, de que (definitivamente) o Pamplona pertence a Bauru e aqui passa a ser processado cada registro do empreendimento.

CONSEQUÊNCIAS 

Em uma das frentes de ação, divulgada pelo CONTRAPONTO, o MP denunciou nove pessoas e três empresas por crimes cometidos para a implementação do condomínio de luxo em área de preservação do manancial do Rio Batalha. Conforme esta ação, para viabilizar o Pamplona Residencial, os envolvidos efetuaram uma série de delitos desde 2008, como uso de documentos falsos, atos de falsidade ideológica, ilícitos ambientais e indução de consumidores a erro.
A área do Pamplona Residencial está situada em Bauru, próximo ao limite com Agudos, e contém várias nascentes que alimentam o Rio Batalha, responsável hoje por cerca de 27% da água distribuída à população bauruense.

Em 2008, o empresário Ércio Luiz Domingues dos Santos e o então vereador Marcelo de Paula (faleceu em 2020), sócios da recém-criada Pamplona Consultoria Agropecuária LTDA (posteriormente Pamplona Urbanismo LTDA), adquiriram o terreno por R$ 600 mil, conforme documentos na ação.

Conforme a denúncia do MP Federal, Marcelo sabia das proibições para edificar no local devido às rígidas leis ambientais do município. Ocupante do cargo legislativo desde 2005, ele havia coordenado os trabalhos que resultaram na aprovação do Plano Diretor de Bauru, com artigos que limitavam as construções em áreas importantes para a preservação de mananciais. Ainda assim, o parlamentar participou da compra, já com o objetivo de dividir a área em aproximadamente 400 lotes imobiliários de alto padrão.

Concluído o negócio, Marcelo e Ércio providenciaram a aprovação do empreendimento por meio do registro ilegal do imóvel em Agudos, onde as normas ambientais seriam mais brandas. Eles se valeram da adulteração de estudos topográficos para justificar a inscrição do terreno na cidade vizinha a Bauru, conforme o processo.

Além disso, conseguiram que o prefeito de Agudos na época, José Carlos Octaviani, incluísse a área do Pamplona no perímetro do Município a partir da aprovação de uma lei de expansão urbana. Em apenas seis dias, o texto foi votado e sancionado, apesar de o chefe do Executivo ter ciência de que o local, na realidade, integrava Bauru, denunciou o MPF.

Na visão da Promotoria, o processo foi aprovada sem embasamento técnico e infringiu uma série de diplomas legais, entre eles o Estatuto das Cidades, a Lei de Parcelamento do Solo Urbano e a Lei de Proteção da Bacia Hidrográfica do Rio Batalha.

MAIS FRAUDES

Com a escritura em mãos, os sócios selaram contrato com as empresas H. Aidar e Assuã, de propriedade deHalim Aidar Junior e William Shayeb, que depois fariam a pavimentação e a estruturação do futuro condomínio em troca de 75% dos lotes disponíveis. Eles foram condenados em primeira instância. Há recurso em segundo grau.

O grupo manteve o uso de documentos inidôneos para a obtenção de licenças necessárias ao empreendimento e atualizações cadastrais, com novos relatórios técnicos falsos assinados pela arquiteta Gisele Simão Aidar (absolvida) e o engenheiro Almir Oliva Ferreira.

Na Companhia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), por exemplo, os papeis forjados foram suficientes para a concessão da licença ambiental. O gerente regional do órgão em Bauru, Alcides Tadeu Braga (também condenado), aprovou o projeto sem levar em consideração alertas de possíveis impactos e o fato de a área fazer parte da zona de proteção do rio Batalha.
As obras do Pamplona começaram em 2012. Até dezembro do ano seguinte, os proprietários já haviam desmatado a área, realizado a terraplanagem e construído muros de cercamento e o portal de entrada.

Para completar a série de delitos, os gestores do projeto imobiliário induziram centenas de consumidores a erro ao veicularem propaganda ostensiva com informações enganosas sobre a localização e a regularidade do empreendimento, traz o emblemático processo. Quase todos os lotes foram vendidos.

PARALISAÇÃO

Após cinco autos de infração ambiental lavrados pela Polícia Militar e o ajuizamento de uma ação civil pública pelo MPF, a Justiça Federal determinou, em liminar de março de 2014, a imediata paralisação da obra, decisão ratificada em sentença proferida em outubro.

A ordem judicial estabelecia a obrigação dos envolvidos de demolir o que já havia sido construído, bem como adotar as medidas necessárias à recuperação dos recursos naturais degradados, de modo que o imóvel retornasse ao estágio em que se encontrava antes do início do empreendimento.

O número do procedimento penal é 0002324-25.2015.403.6108.

Em 2015, um ano depois que os terrenos do loteamento foram vendidos, a Justiça Federal aceitou denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra empresas e pessoas envolvidas na aprovação e construção do Residencial Pamplona, em Bauru.

Na época, nove pessoas e três empresas tornaram-se réus, acusadas de crimes contra o meio ambiente, contra a lei de parcelamento do solo e contra os direitos do consumidor.

Em 2016, em mais um capítulo do caso, a Justiça condenou as empresas responsáveis pelo residencial a restituir o valor de um dos lotes do condomínio e a pagar uma indenização por danos morais a uma compradora. Há execução em andamento, recursos e outros pontos de pendência. Até apartamentos de Hotel na zona Sul de Bauru foram bloqueados em disputa por garantia para futuro ressarcimento.

52 unidades do hotel no complexo do Metropolitan foram oferecidos pela Assuã (responsável pelo Pamplona juntamente com a própria empresa que dá nome ao condomínio e H. Aidar Pavimentação e Obras) em substituição de garantia. Os valores levantados pelo MP para garantir as futuras indenizações foram apontados em cerca de R$ 28 milhões, na época.

AÇÃO FEDERAL 

O caso Pamplona integra medidas judiciais pelo Ministério Público Federal com apontamento de irregularidades no registro do empreendimento e passivo ambiental. Nos processos federais 0001274–95.2014.403.6108 e 0003088–79.2013.403.6108 estão sendo discutidas essas questões.

Ação estadual Consumidor Pamplona: 1005207–22.2015.8.26.0071

LEIA MAIS sobre o caso AQUI: Crime no caso Pamplona: sentença absolve 3 pessoas e condena 5 e as 3 empreendedoras – CONTRAPONTO

5 comentários em “Caso Pamplona: juiz anula todos os registros em Agudos porque loteamento é em Bauru”

  1. José Xaides de Sampaio Alves

    Triste história urbanística. É esperar para ver o desfecho final numa era de sinais contra os direitos urbanos pela justiça. Excelentes exclarecimentos.

  2. Nossa eu nunca tinha ouvido falar nisso que estavam destruindo as nascentes do batalha
    Meu a vdd de Bauru tem tatos imóveis abandonados pq eles querem destruir a natureza construindo mais imóveis?

    1. Isamara Aparecida Geraldo Batista de Oliveira

      Elaine, bom dia!
      Na época havia um contrato bem rígido onde o condomínio seria totalmente respo responsável pela manutenção das nascentes, hoje virou um pasto com gados que pisotiaram e as nascentes precisam ser recuperadas urgentemente!
      Esse assunto é muito mais complexo do que esse artigo publicado.
      Pior que isso só esse tanto de plantaçoes de eucaliptos que está acabando com a água de nossa região.

  3. Já não desdenho de quem caiu num conto de bilhete premiado, pois, neste caso, também caí.
    Além das preocupações ambientais, devemos olhar para as muitas famílias de boa fé que compraram os referidos lotes. Diante de tantos flagrantes delitos, esse empreendimento deveria ser barrado no início, pois em seu lançamento estavam autoridades de Bauru e Agudos. Isso posto, ficam evidente das diversas instâncias que autorizaram o empreendimento. A justiça é lenta e penaliza somente aqueles que, como eu, despenderam recursos conseguidos com suor para aquisição de um sonho que virou um pesadelo. Somos os mais prejudicados e quase sempre preteridos. Lamentável!

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