A Companhia de Habitação Popular de Bauru (Cohab) sofreu, nesta semana, o início de bloqueio em sua conta bancária, em cumprimento a decisão judicial de cobrança (já em fase de execução há anos) realizada pela Caixa Econômica Federal. O bloqueio atinge até R$ 41 milhões apenas em uma das ações de execução, em razão de processos antigos onde a Caixa cobra o retorno de valores obtidos junto ao FGTS pela companhia para a construção de moradias.
Existem inúmeras ações de execução – portanto já em fase final de cobrança – contra a Cohab movidas pela Caixa. Mas, de 2007 a 2019, essas cobranças contaram com a concordância do banco federal pelo adiamento. As partes ficaram, todo esse tempo, durante a gestão Gasparini Júnior, mantendo os processos suspensos sob alegação (conjunta) de negociação para a composição da dívida. Como se sabe, a denúncia de desvios na Cohab apontados por investigação do Gaeco, em dezembro de 2019, interromperam esse ciclo.
O bloqueio de bens sofrido neste momento pela Cohab está em uma das mais de 10 ações de cobrança da Caixa que tramita na Justiça Federal de Bauru. O caso que gerou o bloqueio está na 3. Vara Federal e foi iniciado ainda em 2014. O bloqueio, a princípio, não asfixia a Cohab neste momento, porque está limitado a R$ 40 mil mensais, até o esgotamento de todo o valor de R$ 41 milhões.
Mas, como dito, este é apenas um dos processos já em execução. O valor total de ressarcimentos já em execução ultrapassa a R$ 300 milhões, apenas se considerado valores sem aplicação de correção e multas (como a tal cobrança de taxa de pontualidade).
A presidência da companhia informou, através da assessoria de imprensa da Prefeitura, que ainda não tomou ciência do conteúdo da medida judicial Contudo, o CONTRAPONTO apurou que o bloqueio já é de conhecimento interno, porque é realizado pelo sistema Bacen jud, pela via judicial. Já está em aplicação.
A execução para o pagamento de valores do FGTS pela Cohab está no processo em que também figura no polo passivo (como executado), o Município de Marília. A cobrança tramita desde 2014.
REAÇÃO
No bastidor, a decisão pela retomada de execução é vista como uma reação imediata da Caixa ao anúncio pelo atual governo de que não aceita o valor da dívida cobrada pelo banco federal. O presidente da Cohab, Alexandre Canova, afirmou, oficialmente, em audiência pública de prestação de contas, que vai auditar a dívida.
O governo anterior, até dezembro de 2020, ingressou com ação judicial na Justiça Federal para garantir o andamento de acordo. E obteve liminar que autoriza a composição sem entrega, no curso do processo, de certidões. A Caixa havia tomado a decisão de arquivar o pedido de acordo, no final do ano passado.
Mas o atual governo adotou caminho inverso. Não quer assinar acordo porque considera que o valor cobrado (hoje apresentado em um total de R$ 353 milhões) está errado.
Segundo a Cohab, haveria erros na fórmula de cálculo, com ocorrência de juros sobre juros nas contas (chamada de anatocismo pelo sistema). Além disso, a companhia também diz que a Caixa aplica critérios desfavoráveis (tidos como incorretos) na composição entre créditos e débitos.
O sistema chama esta medida de data a data. O Contraponto apurou que a Associação Brasileira de Cohab (ABC) orienta as companhias, como Bauru, a exigir que a Caixa atualize créditos dos contratos (a chamada habilitação de valores do Fundo de Compensação – FCVS – que regula as prestações de contratos antigos com base nos salários dos mutuários) na mesma base que aplica para cobrar o retorno do FGTS emprestado para a construção de moradias.
Ou seja, as Cohabs reclamam que a Caixa cobra a devolução do FGTS aplicando a “taxa Selic cheia”. Mas na hora de calcular créditos para deduzir da conta (compensar, ao final), o banco federal calcula pela data. E, no sistema data a data, a atualização em favor da Cohab é, quase sempre, com taxa inferior.
Alexandre Canova disse que não assina nenhum acordo com a Caixa sem auditar. Sua equipe administrativa mencionou que tem esperança de que o montante da dívida seja quase inteiramente anulado com a aplicação considerada correta na fórmula de cobrança.
CONSEQUÊNCIAS
O bloqueio gera um impasse que representa centenas de milhões. E esta é a questão que o governo Suéllen Rosim terá de decidir (sem errar).
O Município aposta no erro de cálculo (juros sobre juros e descompasso na remuneração de créditos x débitos) – e corre o risco de novos bloqueios, todos milionários -, ou tenta compor e “convencer” a Caixa de que começa a pagar pela dívida vencida de mais de 10 anos, mas, com o “benefício” de não incidência de juros de 6,08% (mas de 3% sobre a conta até 2026) e do “perdão” na cobrança por atrasos (a tal taxa de pontualidade)?
Na execução judicial, a Caixa obtém bloqueio sobre tudo. Inclusive os honorários do corpo jurídico do banco federal são calculados pelo todo. A dívida total, com todos os “penduricalhos” questionados pela Cohab vai para R$ 1,4 bilhão, somente na carteira com o FGTS.
Eis a encruzilhada, fatal e decisiva em torno da maior dívida acumulada do Município.
Excelente como sempre. Tá dando um show de jornalismo investigativo.
Diante de um quadro dantesco, como esse, penso que a única saída será a liquidação da Companhia, com a Caixa como liquidante, porque é a maior credora.
É repartir o bolo que existe!
Para reflexão.