Malha Oeste: audiência pública de Brasília expõe erros do estudo para novo leilão e exclusão de 160 cidades paulistas

A audiência pública realizada hoje pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para discutir o estudo para nova concessão de 1.625 km da Malha Oeste expõe falhas operacionais e que afrontam o interesse estratégico tanto do País quanto, em particular, de pelo menos 160 cidades paulistas, que pelo projeto se tornariam apenas “corredor de passagem” para grandes cargas entre Corumbá e Mairinque, passando por Bauru.

Veja abaixo, a posição dos participantes preocupados com a defesa dos interesses dos paulistas no processo em andamento – aberto pelo então ministro de infraestrutura no governo Bolsonaro, Tarcísio Freitas. Recebemos a posição do Estado a respeito: silêncio total. A assessoria de imprensa da Secretaria Estadual de Transportes, Logística (inclui Meio Ambiente) repetiu: “estamos em silêncio ouvindo as discussões na audiência para manifestação dentro do prazo”. Acionamos a Casa Civil. E nada! Reiteramos o pedido. A agência reguladora recebeu inúmeros apontamentos de erros e contradições consideradas técnica, financeira e operacionalmente no estudo.

Pelo governo federal, João Carlos Parkinson, ministro das Relações Exteriores, enfatizou que o estudo contratado pela ANTT “tem de ter visão estratégica e de integração do Cone Sul. A carga que vai até Shangai hoje leva 60 dias até o Porto de Santos e pode ser feita em 23 dias por este corredor. É falha grave do estudo não incorporar o potencial da ligação bioceânica, estratégica para o Brasil, o novo eixo de movimentações de riquezas no mundo, sobretudo em relação aos asiáticos”.

Ele ressaltou, ainda, que o projeto também falha ao não prever o uso da via férrea em dois sentidos. “Com a retomada operacional deste corredor, interligando Atlântico ao Pacífico, porque após Corumbá a Bolívia tem ferrovia métrica igual a nossa, teremos outro caminho para importação. A custo bem menor do que hoje. A consultoria não leva isso em conta e o estudo não vê isso”, amplia.

O ministro do atual governo posiciona, ainda, que não bastasse a conhecida saturação do sistema rodoviário, o estudo não leva em conta posições para o futuro estratégico do desenvolvimento das cidades e do corredor, junto com o Cone Sul. “Temos investimentos já em andamento, como no Porto Martin Tico, via Uruguai”, exemplifica.

Outra falha é a não “integração ferroviária com o Paraguai, nem Bolívia. São 60 anos de concessão. O estudo foca no interesse das grandes cargas, importantes, mas para o mapa atual. Celulose, minério. Mas não concebe a visão de futuro para um projeto estratégico desse porte”. Outra falha, relevante, destacou o ministro “é não conceber locomotivas atuais, mesmo a híbrida, ou com baterias elétricas no futuro breve, ou até hidrogênio verde”.

Do Governo Federal, João Carlos apontou falhas graves no projeto de concessão

EXCLUSÃO DAS CIDADES

O representante da União ainda ressaltou, ao final, que o projeto “desconsidera o Centro Oeste e a integração com a nova realidade econômica para uso dos modais, sobretudo o potencial de uso de escoamento pelo Oceano Pacífico em detrimento ao Atlântico. O estudo leva em conta os atuais interessados nos negócios de porte, mas erra ao excluir a integração do País, o incremento para atividades nas cidades, os novos serviços para subprodutos das plataformas e a relação com outros modais”, finaliza.

O empresário bauruense Antonio Sola Neto, da Transfesa, lembrou que a Malha Oeste foi recorde em índices de utilização da ferrovia com melhores índices para ferrovias métricas. Em 2010, o grupo que ele lidera retomou o complexo de oficinas em Bauru, “destruído pela concessão”. “Retirar o ramal de Ponta Porã é grave. Temos cartas de 70 prefeitos, Legislativos somente até Três Lagoas, a partir de Bauru, reivindicando para a ferrovia voltar a funcionar mas também para uso essas cidades. Essas cartas foram enviadas ao deputado federal Capitão Augusto”.

Sola pontuou que “o estudo se volta a grandes cargas e retira as cidades do processo. As cidades nasceram com essa ferrovia e com ela se desenvolveram. Sem considerar uso para pequenas e médias cargas e potencial de desenvolvimento com outros modais, como em Bauru e toda região no Centro Paulista, dezenas de cidades serão apenas terreno de passagem para volume enorme de cargas”.

O empresário reiterou, como outros que se manifestaram na audiência, que “bitola larga para a Malha Oeste é erro enorme, com aumento enorme do custo e muita demora para retomada da operação. Relatório do então deputado estadual Carlos Braga mostrou como a privatização já no governo Fernando Henrique Cardoso destruiu esta malha. Queremos concessão para potencializar e não desconsiderar negócios regionais estratégicos para Estado de São Paulo e Mato Grosso pelas cidades e não excluir diretamente 70 cidades e 160 no entorno”.

Empresário Antonio Sola Neto, da Transfesa

Exportações de limão Taiti, amendoim, avocado, interligação com hidrovia e inclusão do uso com terminal de cargas também foram citados por especialistas. O chefe de Gabinete da prefeita, Rafael Lima, inscreveu esses pedidos, em especial a instalação de entreposto e ramal em Bauru para interligação com outros modais, como hidrovia e garantir todas as obras que reduzem o efeito do aumento significativo de cargas nas passagens por cidades como Bauru.

Luiz Alberto Fioravante, que atuou pelo governo paulista durante o governo anterior (crítico do então ministro Tarcísio Freitas – “a quem classificou de engenheiro de obras prontas”) apontou que São Paulo refez sua legislação para, com o novo marco do setor, assumir concessões como a da Malha Oeste, junto com Mato Grosso. “Temos um projeto assumido pelo então governador Rodrigo Garcia com lei aprovada na Assembleia Paulista que leva em conta os potenciais de cargas em diferentes negócios em Bauru, Araçatuba. E isso não está considerado. E a multimodalidade com rodovia e hidrovia está esquecido no projeto”, citou.

Também foi reforçado que o projeto está “20 anos atrasado com previsão de locomotiva c44, ultrapassada”.

Roberval Placce, do Sindicato dos Ferroviários, assim como o urbanista José Xaides, enfatizaram a necessidade da concessão garantir obras mitigatórias em estrutura e, sobretudo, retomada do trem de passageiros para a retomada de uso da ferrovia pelas cidades.

 

 

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