Diogo Nunes Pereira, economista da Funprev (Bauru) foi acionado para prestar informações sobre o fundo FIP
Qual a razão para você, leitor que atua longe das relações com o Poder Público, ler reportagem sobre prejuízo em investimento da Funprev Bauru? Assunto chato, técnico, muito especializado! Nossa sugestão: veja nesta matéria como a dificuldade da gestão pública em prestar informações, esclarecer sobre ASSUNTO PÚBLICO, é do mesmo tamanho com que a comunidade “se afasta” da compreensão sobre temas que interferem exatamente nos problemas mais comuns…
Hoje convidamos você a participar de nosso esforço de jornalismo para tentar reduzir um pouco este abismo de desinformação. O exemplo abaixo trata de como a gestão de fundos milionários pelo órgão responsável pela previdência pública municipal (a aposentadoria e pensão dos servidores) se vincula… lá na ponta da peça do dominó…. com a necessidade de compreensão de toda a complexa engrenagem chamada SETOR PÚBLICO. Decisões, escolhas de gestão, impactam lá na sua rua, no seu bairro…
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Vamos lá?!
É missão da administração pública prestar informações claras, objetivas, sobre a gestão, ações, e investimentos de dinheiro público, certo? E o servidor que assume postos de comando tem a obrigação de cumprir esta função, certo? Pois bem! Leia (abaixo, em azul) a nota enviada pela Funprev e tire sua conclusão se esta obrigação foi cumprida.
O CONTRAPONTO acionou, com antecedência necessária, o comando da Fundação de Previdência (Funprev) para que a população (e, em especial os servidores – razão da existência do órgão) saiba as razões de uma aplicação financeira de R$ 3,8 milhões, realizada em dezembro de 2012, estar tendo resultado ruim, negativo. Até abril deste ano, o montante investido já estava R$ 465 mil a menos do valor inicial!
Antes de trazer informações sobre a escolha deste fundo que não deu certo, é preciso repetir obviedades:
Mesmo quem não compreende nada de mercado financeiro sabe que aplicação em banco, ou Bolsa, é feita para buscar rentabilidade. E que “renda” mais do que a poupança (ufa!). Mas logo na primeira aula o investidor também aprende que “aplicação financeira” é risco!
Então é nossa obrigação também informar que é preciso olhar o resultado global das aplicações financeiras a partir de 2012 (data da opção pelo fundo FIP). Como também é necessário explicar porque esta aplicação, do fundo FIP Caixa, não deu certo!
APLICAÇÃO NAUFRAGOU
A Funprev Bauru se deu mal na aplicação de R$ 3,8 milhões, em 2012, no Fundo de Investimento em Participações (FIP), cuja gestão é da Caixa Econômica Federal. Este assunto é bem especializado. Mas, para simplificar, o comando da fundação bauruense apostou em um investimento FECHADO, onde entre algumas características principais estão:
Não é permitido resgatar (retirar o dinheiro) antes do fim. A não ser que o gestor (a Caixa) tome esta decisão em assembleia ou liquide o negócio (fundo).
É uma aplicação exclusiva para determinadas categorias de investidores. O FIP é para qualificados (que contam com analista, gestão corporativa, etc). Ou seja, não estão abertos para quem faz aplicação comum.
O que os responsáveis pela gestão da Funprev Bauru tinham de explicar, agora, é qual era o cenário da época do investimento e, com isso, “decifrar” as projeções da aposta neste negócio de R$ 3,8 milhões desde a realidade econômica do País lá em dezembro de 2012.
DETALHES
A Caixa captou aplicações com fundos de previdência (como a Funprev) para destinar para 7 empreendimentos) com 3 construtoras (PDG Realty, Odebrecht e Queiroz Galvão).
A opção pelo investimento de R$ 3,8 milhões no FIP Caixa, na época, pode estar vinculada às expectativas de investimentos em grandes obras, o ambiente de canalização de recursos do governo ainda sob o “efeito positivo” do PAC, no governo Lula…
Mas, para dois especialistas em mercado de aplicações de alto valor ouvidos pelo CONTRAPONTO, naquela data a ESCOLHA feita pela Funprev pode ter se dado muito mais “pela empolgação do momento do que pela opção técnica. Isso porque os relatórios daquele cenário mostram opções muito mais seguras e mais rentáveis” do que o fundo FECHADO, onde o investidor minoritário fica “refém” do gestor no FIP, a Caixa.
Vamos refletir sobre incidências possíveis?
A tomada de decisão no final de 2012 veio acompanhada das regras do jogo. Ou seja, o Comitê de Aplicações da Funprev sabia que apostar no título FIP Caixa significaria estar vinculado ao investimento por 3 anos.
Outro ponto pra refletir: ah… mas a Funprev aplicou em “n” “papeis” e somente este e um “outro” é que deram prejuízo naquele período. Ora! Cada escolha, uma sentença!
Havia (entre as opções de maior risco) aplicações com boa perspectiva de rentabilidade e sem ser de título “FECHADO”, onde a fundação ficou refém do gestor, a Caixa? Resposta: SIM! Então, não é razoável “pendurar” na avaliação global dos resultados. Este título foi uma péssima escolha! E o prejuízo acumulado de sua desidratação (o valor devolvido é MENOR do que o investido), mais o que a Funprev “deixou de ganhar” de 2012 até 2021 é o RESULTADO DAS PERDAS!
Trazendo outra esta perspectiva para a gestão de aplicações na Funprev Bauru, é preciso situar que a Caixa (que sempre teve acesso natural ao comando local por ser a gerenciadora de repasses federais e convênios) ampliou seu “poder de proximidade” institucional (operava a folha de pagamento dos servidores, a maior da região). Ou seja, não é nada estranho (nem errado, a princípio) imaginar que os executivos do banco federal tenham exercido (como ainda têm) seu poder de influência na sugestão de investimentos….
O fato é que a crise econômica apertou nos anos seguintes, e (como nenhum especialista de mercado poderia adivinhar), veio a Lava Jato em 2014. E o cenário só piorou. Os custos da construção civil (base dos investimentos do dinheiro captado com o FIP Caixa) subiram. E os efeitos sobre esta aplicação, até aqui, só pioraram.
Mas por que o comando da Funprev mostra dificuldade em exigir explicações da Caixa?
Como fica a situação deste fundo que teve seu vencimento “esticado” de abril passado até o final do ano?
Por que a Funprev cria obstáculos em explicar sobre conteúdos de sua gestão?
Este assunto, registramos, não chegou “ontem” ao comando da fundação, de novo sob a caneta de Donizete do Carmo…. (Em tempo: Por que o grupo de trabalho sobre prescrições no Comprev, sob apuração pelo MP, foi ‘fechado’ na fundação?)….
O processo do caso FIP Caixa “queima” nas mãos de conselheiros e especialistas internos há um bom tempo….
Mas somente na próxima terça-feira é que conselheiros, comitê de investimentos e a consultoria especializada contratada pela Funprev vão se reunir com a Caixa para buscar explicações…
ABAIXO A NOTA NA ÍNTEGRA ENVIADA PELA FUNPREV:
CAIXA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA MULTIESTRATÉGIA FIP
CNPJ: 13.767.159/0001-88
Início do fundo: 12/12/2011
Tipo de fundo: FIP fechado
O fundo está em funcionamento e enquadrado na resolução CMN 3922/2010 (artigo 8 Inciso IV)
Número de cotistas: 19 entre Regimes Próprios de Previdência Social e Fundos de Pensão
Público alvo: Investidores qualificados
Administração: Caixa Econômica Federal
Gestão: Caixa Econômica Federal
Custódia: Banco Bradesco
Participação da FUNPREV no patrimônio do fundo 3,21%
Primeira aplicação da FUNPREV: dezembro/2012
Valor aplicado desde o início: R$ 3.867.488,96
Valor recebido desde o início: R$ 3.401.638,97
Diferença: R$ 465.849,99
Saldo atual: R$ 40.277,01
O fundo investiu em 7 projetos (empreendimentos) desde o início com parceira com 3 construtoras (PDG Realty, Odebrecht e Queiroz Galvão). Todos os projetos foram concluídos e as unidades comercializadas.
Segundo a administradora o fundo foi diretamente impactado pela pressão de custos do setor imobiliário e a crise econômica entre 2014 a 2016.
A carteira do fundo foi reprocessada duas vezes sendo a última no início de 2021 e isso fez com que o saldo aplicado diminuísse consideravelmente. De lá para cá a FUNPREV tem atuado de forma mais incisiva em relação à administradora do fundo.
A FUNPREV sempre participou de todas as assembleias de cotistas do fundo manifestando seus votos, sendo muitas vezes vencida pelos demais cotistas diante da participação pouco expressiva no PL do fundo.
A FUNPREV tem mantido comunicação com o Tribunal de Contas sobre os desdobramentos do fundo, inclusive com envio de documentos.
Temos feito reuniões com a Caixa e com a consultoria Crédito & Mercado a fim de apurar se houve falhas por parte do gestor e do administrador e em caso positivo tomar as medidas judiciais cabíveis inclusive com representação à Comissão de Valores Mobiliários.
O FIP tem sido monitorado de perto pelo Núcleo de Gerenciamento de Investimentos da Fundação, formado por um economista em dedicação exclusiva a área de investimentos e também pelo Comitê de Investimentos e os Conselhos Curador e Fiscal, além da Presidência do órgão.
Em relação a escolha do fundo na época, a FUNPREV recebeu ofertas de diversos fundos imobiliários e optou pelo fundo gerido e administrado pela Caixa, após análise minuciosa do regulamento e demais documentos legais do fundo, levando em consideração a expertise da Caixa nesse segmento imobiliário.