Vice na chapa presidencial com Lula, o ex-governador paulista Geraldo Alckmin passou a tarde de terça-feira em Bauru, mas como médico. Deu palestra a estudantes do primeiro ano da graduação em medicina da Uninove, no auditório ao lado da Praça da Paz. Aos futuros colega de medicina, Alckmin falou sobre a evolução de doenças graves no mundo, citando, entre outras, a varíola, a gripe espanhola em 1918 (que matou 50 milhões de pessoas no mundo), o ebola que apareceu com força em epidemias em 1976/1995/2007-2014 e a Aids, surgida em 1981, com 30 milhões de mortos.
Falou de gestão de programas em prevenção, da telemedicina. O médico Alckmin também advertiu aos alunos de medicina que vão atuar para uma geração em que o envelhecimento populacional no Brasil exigirá esforços adicionais de gestão desde já e ao longo dos próximos anos, com necessidade de ainda mais recursos para o custeio da hoje subfinanciada saúde pública (que é mais cara para idosos e que serão maioria);
Apontou neste cenário desafios na ordem das mudanças epidemiológicas, onde as doenças crônicas passam a ser de tratamento mais caro e com maior incidência entre faixas etárias com cada vez maior expectativa de vida.
Após a palestra, Alckmin atendeu uma fila extensa formada por alunos que pediram fotos. Antes do retorno a São Paulo, de carro, por volta das 16h15, atendeu pedido de entrevista. Ao descermos juntos, de elevador, o médico e seu fiel escudeiro na região, ex-deputado Pedro Tobias, tascou: “Geraldo, este jornalista foi o mais carniceiro no jornal”…. O ex-governador riu e respondeu: “Conforme Millor Fernandes, jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados…”.
Geraldo chegou a Bauru ainda para almoço. Pedro Tobias reuniu prefeitos para o encontro.
Na entrevista (segue em áudio na íntegra, para quem preferir neste link: https://soundcloud.com/nelson-4-1/geraldo-alckmin-vice-de-lula-entrevista-14062022 ), aproveitamos o breve tempo de 7 minutos exclusivos para alçar a avaliação do candidato a vice na chapa de Lula (PT) para um “gancho” de sua palestra:
Como enfrentar o tripé do aspecto demográfico, o envelhecimento da população com a já realidade de subfinanciamento da saúde no País, o agravamento da fome que alcança 33 milhões de brasileiros e a previdência (onde a atual regra aprovada no governo Bolsonaro estabelece mais tempo de trabalho e recolhimento com redução no valor das aposentadorias?
Alckmin – Olha, em relação a fome, o País precisa crescer para enfrentar isso com solidez. De um lado, voltar a economia crescer, com uma agenda de competitividade. O Brasil tem condições de crescer a 4%, 5% ao ano. A outra vertente é combater a fome, a desigualdade social. Há necessidade de um conjunto de políticas públicas para isso. Vou dar um único exemplo, o salário mínimo. O salário que tinha ganho real de 40% com o Fernando Henrique e com o Lula de mais de 60%, em seus períodos, hoje tem perda.
Então imagine 70% dos aposentados e pensionistas do INSS com ganho de 1 salário, R$ 1.212,00 mensais. É pessoa idosa, mulher idosa que por vezes não tem nem casa própria. Diria que o foco é economia e social. Economia, fazer o Brasil voltar a crescer. Porque no último ano do presidente Lula, em 2010, a economia cresceu 7,5% e já sem inflação, com ganho real para o salário mínimo.
E subfinanciamento da Saúde?
Alckmin – No mundo inteiro há encarecimento da saúde. E por três razões principais. Mudança demográfica (população mais idosa), mudança epidemiológica (muita doença crônica, degenerativa) e incorporação tecnológica na medicina (que é muito avanço, mas com tecnologia e custos bem maiores para ação em saúde).
Se você os dados dos países, Portugal triplicou gasto da referência com o PIB (Produto Interno Bruto) para saúde (11%), Espanha foi a 12% para custear saúde, EUA destina 18% do PIB para o setor. E o Brasil é 9,5%, com o SUS (Sistema Único de Saúde) que atende a 77% da população tendo 4,5% da fatia de recursos e o restante é do setor privado. O sistema está de fato muito subfinanciado. Tem de melhorar a gestão, sempre, e tem de por mais recursos para atender à maior fatia que precisa. E isso exige fazer a economia crescer, o País voltar a ser competitivo em outros setores da economia.
E governar é escolher. O dinheiro nunca será suficiente para enfrentar os desafios. Tem que priorizar. E não há nada mais importante do que a vida da pessoas. Melhorar gestão, de um lado, e tecnologia vai ajudar muito, e por mais recurso na linha.
O senhor pontuou aqui a distribuição desigual no país de médicos por regiões. Programas como saúde da família entrariam nisso?
Alckmin – Isso ajuda, ajuda. Mas veja o País está com investimento em saúde caindo. Fui relator da lei orgânica em saúde, a número 8.080, em 1990, como deputado federal. Naquele tempo o País tinha 60% dos recursos federais e 40% nos Estados e Municípios. Hoje inverteu. O governo federal coloca em torno de 40% e Estados e Municípios 60%. Especialmente os municípios, onde o gasto com saúde é bem maior do que os 15% da regra em muitos.
Sobrecarrega muito. E o governo federal saindo, discretamente, do financiamento na saúde. Então há agravamento da crise de subfinanciamento. E saúde emprega muita gente. Se economia cresce e se põe mais dinheiro em saúde, ajuda também na relação com o emprego.
E a previdência, neste tripé, com o País envelhecendo e as duras regras em vigor?
Alckmin – A Reforma da Previdência foi feita nos últimos anos. Mas eu diria o seguinte. Desses pontos, o caminho inevitável é fazer o Brasil crescer. Sem isso, os outros pontos não se resolvem. Pega a questão fiscal. A dívida do governo brasileiro sobre o PIB quando o Lula assumiu era 60%. Quando ele saiu era 40% do PIB. Como despencou a dívida? O Brasil cresceu, a economia. Não tem solução sem crescimento. A pessoa precisa ter acesso ao trabalho para você avançar, melhorar a renda dos brasileiros. O brasileiro empobreceu. Não é possível um País como o nosso ter 33 milhões de pessoas passando fome.
Então esta, em boa dose, será a eleição da ou sobre a barriga vazia?
Alckmin – Não tenha dúvida. Da barriga vazia, da falta de emprego e da perda de renda. Terá de discutir as razões do empobrecimento da escalada da fome. E desse desmanche do Estado, no sentido das instituições. Elas ficam, as pessoa passam. Precisamos ter boas instituições. Você não pode governar para 24 horas combater as instituições, trabalhar contra. O Brasil precisa de um pouco de paz, trabalhar a intolerância, unir, fazer a convergência.
Olha a Alemanha da Angela Merkel. Era a União Democrática Cristã. Ela chamou a esquerda, a social democracia alemã para participar do governo. A Alemanha deu um salto. Sempre que você faz convergência, conciliação, consegue avançar mais.
Este será o papel do senhor?
Alckmin – De todos nós. Tornar a política civilizatória. Estimular as pessoas a participarem. Estimular o jovem a participar. A pior política é a da omissão do cidadão. Convidar a todos a darem sua contribuição. É isso.