
Uma ação civil pública da Associação de Defesa da Cidadania de Bauru (Adeciba) contra a empresa Paschoalotto Serviços Financeiros chama o Departamento de Água e Esgoto (DAE) a se posicionar sobre a fiscalização e cobrança de tarifa de esgoto na cidade para quem utiliza poço artesiano ou caminhões-pipa.
A juíza da 2ª Vara da Fazenda Pública de Bauru, Elaine Cristina Storino Leoni, determinou que o DAE se posicione sobre a reclamação de ocorrência de compra de água por caminhões-pipa por empresas sem caracterização, ou regularização. Contudo, o ponto central da ação contra a Paschoalotto também exige que o DAE se posicione sobre possível perda de receita por pagamentos irrisórios de tarifa de esgoto por quem consome água sem ser medida pelos hidrômetros.
Ou seja, a ação lança que a Paschoalotto, até o final de 2023, teria pago valores reduzidos pelo uso da rede de esgoto, já que ou comprava água de caminhões-pipa ou, a partir de 2024, não tinha o consumo real registrado a partir da utilização de poço artesiano. Com base nessas questões, lançadas na ação civil pública, o promotor de Patrimônio Público, Fernando Masseli Helene, posicionou no processo que o DAE tem de informar se existem outros casos idênticos na cidade. E se posicionar sobre o caso concreto.
A juíza atendeu ao pedido do MP e determinou (no mês passado) que a autarquia se posicione, em específico, sobre a ação da Adeciba. O DAE também terá de se manifestar sobre a forma legal de aferição de cobrança de tarifa de esgoto, especificamente levando em conta a compra de água por caminhão-pipa e ou poço artesiano.
Embora a ação judicial trate de denúncia da Adeciba contra a Paschoalotto, o caso está na seara de inúmeros litígios da autarquia contra consumidores na cidade, há anos. Cada caso é único. Um dos mais significativos envolve processo de cobrança contra a utilização do Recinto Mello Moraes, por anos, pela Associação Rural do Centro Oeste Paulista (ARCO). A Arco contesta o lançamento do montante de tarifa de esgoto. Alega, entre outros, que boa parte da água utilizada no Recinto não voltava para a rede (nas baias e limpeza de animais). O CONTRAPONTO acompanha o caso, já em execução, desde a origem: https://contraponto.digital/notas/justica-determina-bloqueio-de-metade-das-receitas-da-expo-2024-em-execucao-de-divida-do-dae-contra-associacao-rural-do-centro-oeste-valor-supera-a-r-6-milhoes-juiz-jose-renato-silva-nomeia-administ/
O tema também é relevante sob o aspecto da concessão, cujo edital aberto pelo governo municipal está sob análise (de impugnação ou não) pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE). Conforme o estudo Sacre (sobre as formas de produção e exploração da água subterrânea em Bauru), a cidade tem mais de 500 poços artesianos cadastrados. Estima-se que o total seja bem maior.
Quantos o DAE fiscaliza? Com qual periodicidade? Todos contam com hidrômetro na saída do poço? O dispositivo eliminaria, em tese, as discussões em aberto sobre o real valor a ser pago por tarifa de esgoto na rede (já que é evidente que a água que vai para o esgotamento sanitário tem correlação com o consumo total – exceto em casos específicos, por indústrias com sistema de reuso e onde a água é engarrafada ou integra boa parte do produto final – “matéria prima”).
Com a concessão, a gestão integral da cobrança e medição será realizada pelo setor privado.
ADECIBA x PASCHOALOTTO
A ação da Adeciba contra a Paschoalotto chegou à 2ª Vara da Fazenda Pública, em uma segunda versão, no início deste ano. O processo inicial é de 2023. Mas a medida foi arquivada sem julgamento de mérito porque o juízo entendeu que o estatuto da Associação não preenchia requisitos para atuação.
A Adeciba então providenciou alteração no estatuto, inserindo definição, em sua visão, mais organizada, do rol de temas e ou assuntos (difusos) em que atua, em nome da defesa da cidadania, do coletivo.
Em síntese, a Associação questiona que a Pascholotto, com cerca de 12 mil funcionários, paga valores irrisórios pelo uso do sistema de esgoto. E isso acontece, conforme a ação, porque é realizado o registro apenas do consumo de água que passa pelo hidrômetro da empresa. Até 2023, a Paschoalotto comprava água de caminhões-pipa para suas unidades. A partir da reclamação judicial, instalou poços artesianos, mas cujo valor correspondente de tarifa de esgoto continuaria tendo passivo com registro reduzido de valor relativo ao esgoto.
Da mesma forma, a Adeciba descreve que o fundo de tratamento de esgoto (FTE) perde receita. Porque sua cobrança (em 5% atualmente) está vinculada ao consumo medido de água. “Pouco importa se adquire água de particular, da coleta da chuva, produz quimicamente ou outro meio, já que sustenta (a empresa) que não usava água da empresa fornecedora do município. Considerando a imensa quantidade de funcionários da Paschoalotto, por onde escoaria todo o esgoto gerado pelo consumo dessa imensa quantidade de água? Se várias unidades da requerida tem consumo de água do DAE zerados, para onde vai
o esgoto de 12.000 funcionários? Como a Paschoalotto contribui com a manutenção da rede, se determinada unidade produz centenas de vezes mais para a rede pública, mas pagando por uma metragem cúbica mínima?”, questiona a ação.
Sobre o período em que utilizava caminhões-pipa, a Adeciba aponta (com fotos) que a Paschoalotto mantinha abastecimentos rotineiros por empresas sem certificação de legalidade, sem licenciamento técnico. “Qual a aferição da qualidade da água utilizada até então para quem tem 12 mil pessoas trabalhando?”, aborda a ação.
CONTESTAÇÃO
A Paschoalotto Serviços Financeiros confirma a presença de milhares de funcionários em seus quadros. E contesta a ação. Através do escritório Betoni Advogados Associados, a empresa combate que a Adeciba permanece sem legitimidade e representatividade para atuar em causas em nome da defesa da sociedade. A empresa reforça que o próprio Judiciário já arquivou ação anterior nesse sentido e que as alterações estatutárias não resolveram a falha.
O advogado Luis Eduardo Betoni argumenta que a empresa, como prestadora de serviços, cumpre regularmente as normas de medição e faturamento tanto de água quanto esgoto realizadas pelo DAE. “Não há ilegalidade no uso de caminhões-pipa quando esta alternativa foi utilizada para que a empresa, com milhares de funcionários, não corresse risco de desabastecimento diante de crise hídrica na cidade”, aborda.
A empresa posiciona que realiza os pagamentos de tarifa de esgoto (e para o fundo) conforme determinados pela legislação. “O próprio DAE contratou caminhões-pipa na crise (de 2024). Já a fiscalização pelos prestadores deste serviço é do Município, a autarquia e não da empresa”, argumenta. Nesta fase, a Paschoalotto instalou poços artesianos em suas unidades.
O advogado da Adeciba enviou à imprensa a ação número:
1000713-65.2025.8.26.0071