Bauru tem 1.500 hectares de lotes vazios e área urbana espalhada encarece custo por serviços e infraestrutura

 

Bauru tem, neste 2025, ao menos 1.500 hectares de lotes vazios, sendo 648 hectares destes com área de mais de 1.000 metros quadrados. A ocupação do território bauruense também produz uma “cidade desequilibrada”, com a manutenção do ciclo de espalhamento de grandes loteamentos residenciais horizontais, o que encarece o custo de serviços públicos essenciais e exige maior volume de recursos para atendimento de infraestrutura.

Este “retrato” da cidade está no estudo sobre os principais vetores da cidade apresentado pela Fundação do Instituto de Pesquisa Econômica (Fipe) na semana passada. Os dados foram informados aos delegados de cada uma das regiões da cidade que discutem a revisão do Plano Diretor (PD) e da Lei de Uso e Ocupação de Solo (LUOS). A fundação foi contratada pela Prefeitura e atualizou os dados sócioeconômicos e demográficos que já haviam formado o diagnóstico por outra consultoria, a Demacamp de Campinas, em 2019, durante o governo Gazzetta.

A existência de uma “cidade espraiada, com concentração de moradias populares nas bordas, com grandes espaçamentos urbanos e seccionada por rodovias, fundos de vale e trilhos ferroviários” não é novidade em si. O que o estudo da Fipe traz é, no resumo, uma atualização dos dados sobre a grande disponibilidade de terras na cidade, em detrimento a conhecida pressão por novas expansões urbanas.

De outro lado, os técnicos da Fipe ainda atualizam, de forma preocupante, que, além desse estoque de àreas ‘a ocupar’, Bauru também sofre (como outras tantas cidades médias brasileiras) com a utilização desorganizada, clandestina. São dezenas de construções irregulares, sobretudo em áreas rurais, com exploração imobiliária ilegal em áreas de preservação. Assentamentos, ocupações, núcleos clandestinos e parcelamentos ilegais da terra (incluindo grilagem) formam outro grande volume de terras (e moradias) com pressão pela regularização fundiária. O desafio é que recuperar o que foi degradado (condição para regularizar) não é barato, como apontado pelo promotor de urbanismo várias vezes, Henrique Varonez.

O paradoxo do histórico da atual situação de formação da cidade “urbanizada” é que a cidade “cresce na horizontal (e cada vez mais longe um bairro do outro) e reduz o número de habitantes residentes por quarteirão. Conforme a Fipe, a densidade populacional de Bauru caiu de 46 habitantes/quarteirão para 41 hab/quart entre o censo de 2010 e 0 de 2022. “Isso significa que Bauru tem lotes suficientes para ocupar no setor urbanizado, mas continua espalhando núcleos nas bordas, ampliando sua segregação sócio espacial”, avaliam os técnicos da fundação contratada para o diagnóstico local.

Outro dado do estudo: o número de pessoas por residência também é menor no tempo. Eram 3,09 pessoas por domicílio em 2010 (IBGE). Em 2022 caiu para 2,65. Coabitação, custo do aluguel, custo “para viver”, baixos salários, maior endividamento. Menor número de filhos, maior presença de bolsões de pobreza. São muitos os fatores que explicam essa situação.

Outro ponto para não fazer sentido aumentar o perímetro urbano: em Bauru as pessoas também vivem mais. E teremos cada vez mais idosos. E menos jovens. Assim, menor demanda por moradias.

Sim. A população vai estagnar, ou crescer cada vez menos, cita a Fipe – referendando o que disse o IBGE no censo de 2022.

Voltemos a ocupação. A cidade urbana atual tem 1.500 hectares de lotes vazios, conforme o estudo da Fipe. A questão, conhecida, é que, como nas décadas de ocupação anteriores, os grandes vazios urbanos não são, em muitos casos, as áreas onde os donos da terra querem, ou pressionam os governos para construir, especular, ou empreender. Não há. em si, problema de origem nisso. O mercado imobiliário vai, óbvio, fomentar negócios mais rentáveis em alto padrão, em uma frente. E o inverso na outra ponta.

Assim, a carência de política habitacional para baixa renda (com a descontinuidade de programas desde 2016) aumentou o “poder de fogo” de construtoras por empreendimentos mais baratos. Glebas nos “fundos da cidade”, receberam cada vez mais lotes com tamanho reduzido (testadas de 5m).

Ainda em relação aos espaços disponíveis, conforme a Fipe, dos 1.500 hectares de lotes vazios, 650 hectares são de terrenos com mais de 1.000 m2.

A Fipe também identifica as maiores porções de vazios urbanos hoje: As maiores reservas de área não urbanizada no interior do perímetro urbano ocorrem em dois vetores, a saber:

  • na porção norte da mancha urbana municipal, ao norte da Rodovia Comandante João Ribeiro de Barros (SP-294), nas adjacências da Rodovia Marechal Rondon (SP-300) e no corredor que conecta o Aeroporto Estadual, no eixo da Rodovia Cesário José de Castilho (SP-321); e
  • na porção sul, tendo a Rodovia Eng. João Baptista Cabral Rennó (SP-225) e as avenidas José V. Aiello e Mario Ranieri como importantes vetores de novos parcelamentos do solo.

Ainda que boa parte desses vazios seja formado por lotes de pequeno porte, o mapeamento demonstrou que os lotes com mais de 500,0 m², ou seja, com potencial para recepcionar empreendimentos de portes variados, somam 887,7 ha, ou 59,4% da área dos vazios intraurbanos. Fazendo um corte superior, os lotes com mais de 1.000,0 m², com potencial para recepcionar empreendimentos verticais de maior porte, somam 643,8 ha, ou 43,1% da área dos vazios intraurbanos.

“Confrontando tais dados com o perímetro urbano vigente, é possível afirmar que há reserva de vazios urbanos, em suas diferentes classificações, para recepcionar o crescimento urbano dentro da própria mancha urbana consolidada ou em consolidação. As projeções de crescimento econômico e demográfico da cidade, temas que serão abordados adiante neste relatório, poderão indicar se tais vazios são suficientes e adequados, considerando suas características e a distribuição, para acomodar essa expansão.”, concluem os técnicos Fipe.

PRÉDIOS

Entre 2013 e 2017, o mercado residencial vertical manteve um patamar elevado de lançamentos, com uma média de 122.759 m² de área lançada ao ano – próximo a 2 mil unidades habitacionais ao ano. Após nova retração em 2018, há uma retomada com novo pico de 130.602,4 m² de área lançada em 2020. Nos últimos cinco anos (desde 2021), o mercado residencial vertical produziu o equivalente a 68.409 m² de área lançada ao ano, ou aproximadamente 1.140 unidades habitacionais ao ano.

Nos anos 1970, houve uma aceleração do crescimento populacional, e o padrão de urbanização disperso – que persiste até hoje – tornou-se evidente. A cidade viu a emergência de novos bairros vinculados aos principais eixos rodoviários e a ampliação de loteamentos periféricos, frequentemente desprovidos de infraestrutura básica (LOPES JÚNIOR, 2007). Esse processo não é exclusivo da cidade de Bauru, e foi observado em outras cidades médias paulistas.

A urbanização dispersa seguiu ao longo dos anos 1980 e 1990, processo que resultou no surgimento de bairros afastados da área central do município, seguindo o padrão de ocupação fragmentada, configurada por distintas formas de ocupação mediadas pela condição social dos ocupantes.

Rovena, Marlon e Camila, da Fipe, apresentaram o estudo sobre Bauru

Esse fenômeno se intensificou nas décadas seguintes, caracterizando-se pela expansão a partir dos eixos viários, pela disseminação de loteamentos fechados e conjuntos habitacionais.

“Desde a metade do século passado, a ocupação urbana de Bauru tem se estruturado em padrões contrastantes que reforçam a segregação socioespacial. De um lado, a proliferação de loteamentos fechados, especialmente na zona sul da cidade, consolidou enclaves de alto padrão, como Alphaville, Lago Sul e Cyrela Estoril. De outro, a produção habitacional popular segue há décadas um modelo que coloca os conjuntos habitacionais nas franjas urbanas e áreas menos valorizadas, dificultando o acesso à infraestrutura e aos serviços públicos. Esses dois processos resultam no reforço das desigualdades espaciais e no aprofundamento da fragmentação urbana”, descreve o estudo da Fipe.

A tabela acima mostra a evolução da população urbana, área urbanizada e densidade nas últimas décadas. Os números evidenciam o espraiamento territorial em um ritmo maior que o aumento demográfico e, como consequência, a redução da já modesta densidade urbana (bruta), que, entre 2000 e 2020, caiu de 46 para 41 habitantes por hectare.

Vale notar que a densidade não é homogênea no território. A cidade apresenta um número expressivo de glebas vazias, especialmente no interior do perímetro urbano já estabelecido.

a partir de levantamento da Secretaria de Planejamento), em 1996, aproximadamente 47,53% da área urbanizada da cidade era composta por terrenos não ocupados, os quais poderiam acomodar até 300 mil habitantes. Passadas duas décadas, a permanência de grandes extensões de terra não edificada e a fragmentação do tecido urbano indicam que esse padrão persiste, refletindo a continuidade da subutilização do espaço urbano e a dificuldade de integrar plenamente as áreas já urbanizadas da cidade.

A permanência de grandes vazios urbanos, combinada com a ocupação periférica de baixa densidade, reforça a necessidade de políticas urbanas que incentivem o uso eficiente do solo. Um planejamento integrado e estratégias voltadas ao adensamento populacional localizado podem mitigar ou até reverter a fragmentação do tecido urbano, promovendo um desenvolvimento mais equilibrado e sustentável no longo prazo.

TAMANHO DOS LOTES

Conforme o mapa acima, que integra o estudo da Fipe, nas áreas de maior padrão, ao sul, os lotes tendem a ter dimensões maiores que 500 metros quadrados (m²), enquanto nas áreas na “coroa” das regiões oeste, norte e leste os lotes têm menos de 250 m², com alguma presença de lotes menores (125 m²), provavelmente resultantes de desdobros após a implantação dos loteamentos.

Para entender o processo de crescimento da cidade, também, é preciso elencar leis, no tempo.

O perímetro urbano vigente em Bauru é definido pela Lei nº 7.116, de 2018, e perfaz uma área total de 201,8 quilômetros quadrados (km²). Conforme mapeamentos realizados neste diagnóstico, o perímetro foi objeto de sistemáticas alterações, que envolveram expansão, retração e ajustes nos limites.

O primeiro registro do perímetro urbano corresponde à Lei nº 493, de 1956, e já angariava uma área que excedia, significativamente, o centro e bairros adjacentes, ultrapassando os limites das ferrovias nas direções norte e oeste do centro e o limite da Rodovia Marechal Rondon no leste. Naquele momento, o perímetro urbano equivalia a uma área de 37,3 km².

Entre 1958 e 1971, uma série de leis alterou o perímetro urbano, inclusive com retração dos limites indicados em 1956, fato que ocorreu em 1958, com pequena redução na área envoltória da atual Avenida Rodrigues Alves, na zona leste; em 1960, com uma pequena redução no extremo oeste (atuais Vila Industrial e Vila Presidente Eurico Gaspar Dutra); em 1963, com diminuição significativa na porção oeste, trecho que é reinserido no perímetro em 1964, sendo novamente objeto de retração em 1965. Em 1971, o perímetro se manteve menor do que o original de 1956, com pequenas ampliações no norte e leste, mas com redução expressiva na porção oeste.

A Lei nº 1.785, de 1973, dá início à sequência de expansões do perímetro urbano que se seguiram nas décadas seguintes, coincidentes com a produção de moradias populares de promoção pública. Naquele ano, houve a incorporação de áreas em todas as direções da mancha urbana, situação intensificada com a Lei nº 2.118, de 1978, que gerou uma expansão expressiva na direção sudeste, englobando áreas localizadas além da Rodovia Comandante João Ribeiro de Barros (SP-225). Desde então, entre 1979 e 2003, há mais uma sequência de leis que, sistematicamente, adicionam áreas ao perímetro urbano proposto em 1978.

Aqui ocorre o principal marco temporal de “aproveitamento de oportunidades” – sobretudo com exploração imobiliária na cidade. Isso aconteceu em todo o País. Dezenas de donos de glebas (enormes), muito distantes até do atual centro atual da cidade, correram para aprovar projetos de futuros loteamentos. A correria veio por causa da lei federal 6.766/79. Até então, quem dividia gleba em lotes não pagava pela infraestrutura de ruas, guias, infraestrutura básica.

O “fenômeno” adicional que gerou enorme estoque disfuncional – social e urbano – em Bauru é que, ainda por algumas décadas seguintes, as aprovações de empreendimentos não vieram acompanhadas de mitigação, como no trânsito. As contrapartidas também permanecem sem regramento equilibrado até hoje.

A próxima grande alteração do perímetro urbano ocorreria com o Plano Diretor de 2008, momento no qual sua área atingiu 156,5 km² e adquiriu as características similares ao perímetro vigente desde 2018. Em 2008, foram adicionados os bairros no vetor sul, seguindo o eixo da Avenida José V. Aiello, além de áreas de influência das rodovias no oeste e norte do município.

O perímetro vigente desde 2018 corresponde à uma expansão de, aproximadamente, 29% da área do perímetro urbano de 2008, com a adição de 45,3 km². Dos 201,8 km², aproximadamente 44% (ou 88,7 km²) do perímetro é classificado como área urbanizada, considerando o mapeamento do MapBiomas de 2023. A mancha urbana de Bauru perfaz 90,4 km², considerando áreas dentro e fora do perímetro urbano.

O perímetro urbano atual engloba quase toda a área urbanizada principal do município, estendendo-se ao longo dos eixos das rodovias Comandante João Ribeiro de Barros (SP294) no oeste, Marechal Rondon (SP-300) e Cesário José de Castilho (SP-321) no norte, até o Aeroporto Estadual. Conta, também, com três porções descontínuas, correspondentes ao distrito de Tibiriçá, no norte, ao bairro Águas Virtuosas, no limite com Piratininga, e ao bairro Vale do Igapó, no extremo oeste, na divisa com Pederneiras e Agudos.

Na porção oeste do município, o perímetro urbano já coincide com o limite da área urbanizada e está a cerca de 2,0 km da divisa com Piratininga. Nota-se, contudo, a ocorrência de áreas em processo de ocupação urbana, localizadas fora do perímetro, bem como a presença marcante de áreas ainda desocupadas, inseridas no perímetro, junto aos bairros da zona sul.

Na porção oeste, o perímetro já toca parte significativa do limite com Pederneiras, também com a presença de grandes áreas desocupadas ou em processo de urbanização regular e irregular.

No limite sul do município, o perímetro urbano avança até a divisa com Agudos, nos bairros Vale do Igapó, Recanto Maricel e Chácaras Bauruenses. Todavia, há nesses bairros grande incidência de áreas não urbanizadas e lotes vagos, denotando que se trata de um território de transição entre o urbano e o rural, com a urbanização ainda não consolidada.

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