Detalhamos o “enrosco” da cobrança milionária da Saúde contra a AHBB de Lins na Justiça

A secretária de Saúde Alana Trabulsi, à frente, na audiência pública com a presença de gestores do Jurídico e Finanças sobre as pendências com a AHBB

Deve, ou pode, o governo municipal manter contrato de prestação de serviços de plantões de médicos e enfermeiros com entidade que, desde o início, não cumpre suas obrigações relativas à prestação de contas? Pode, ou deve, a gestão pública assinar um segundo contrato com a mesma empresa (associação) sem que o primeiro compromisso tenha sido cumprido, com créditos pendentes? Vale a justificativa de que, em se tratando de serviço essencial, o governo pode deixar de lado o descumprimento do contrato para firmar novo contrato?

Estas indagações, levantadas pelo CONTRAPONTO na semana passada, em relação ao crédito apontado pela Prefeitura de Bauru de R$ 1,2 milhão recebido pela AHBB, permanecem sem solução. Na verdade, como adiantado, a pendência foi para o Judiciário.  Advertimos que são inúmeras, muitas informações, nessa típica equação entre notas fiscais, valores cobrados, valores alegados, e saldos…. Mas vamos detalhar pra você o que está na ação:

 

O Município acaba de propor Ação de Obrigação de Fazer cumulada com Consignação em Pagamento, em relação à ASSOCIAÇÃO HOSPITALAR BENEFICENTE DO BRASIL – AHBB, para obter sua condenação a prestar contas referentes a valores de contratos de prestação de serviços em saúde, tendo em vista disposições contratuais firmadas entre as partes, bem como a devolução de valores que foram repassados cujos gastos não foram comprovados e saldo de conta corrente dos contratos com os devidos rendimentos.

DOS CONTRATOS

O Município descreve ao Judiciário que celebrou dois contratos com a AHBB sendo o primeiro Emergencial nº 10.627/22 e, na sequência, outro, tendo em vista o encerramento do contrato anterior. Os contratos emergenciais nº 10.627/22 e 10.879/22 com a Associação Hospitalar Beneficente do Brasil-AHBB, tinham como objeto a prestação de assistência em saúde por meio da organização, administração, gerenciamento e operacionalização das ações de saúde, que seriam realizados nas unidades de saúde do município de forma temporária e extraordinária.

O contrato nº 10.627/22 foi celebrado em 21 de janeiro de 2022, com início das atividades em 26/01 e prazo de vigência de 180 dias, com valor total de
R$ 6.131.249,34. Mas veio um aditivo, no dia 20 de abril. Foram incluídos serviços na UPA Geisel, por tempo determinado, com acréscimo de R$ 266.625,00 .

NOVO CONTRATO

Mas o governo firmou um novo contrato, mesmo a AHBB não tendo cumprido o primeiro, segundo a própria administração.

A administração firmou então o contrato emergencial nº 10.879/22, celebrado em 14 de julho de 2022 com prazo de vigência de 90 dias e valor total de R$ 2.629.037,34, como continuidade dos serviços.

OS PAGAMENTOS

A administração realizou os repasses para uma conta corrente específica. Mas a AHBB, conforme a Prefeitura, movimentou todos os valores para outra conta. O governo descreve na ação que o repasse da primeira parcela do primeiro contrato foi realizado de forma proporcional aos dias de prestação de serviços de janeiro/22 e foi pago no dia 10 de fevereiro.

Já os repasses da segunda e terceira parcelas, referente a fevereiro e março de 2022, foram realizados de forma integral e pagos nos dias 08/03 e 06/04, respectivamente. O repasse da quarta parcela foi realizado também na integralidade, no dia 05/05, junto ao montante referente ao Segundo Termo Aditivo, pago no dia 12/05, esta parte proporcionalmente aos dias de serviços prestados na UPA Geisel.

Indagada a respeito do pagamento integral, mesmo sem a prestação de contas, logo no início do contrato, o governo argumenta que o repasse integral nos primeiros meses “se deu em virtude da necessidade de proporcionar um prazo operacional para a contratada”. Ou seja, na ação o Município assume que firmou um contrato repassando valores, no início, para formar caixa para a empresa privada.

PRESTAÇÃO DE CONTAS

Ocorre que, conforme previsto no Contrato 10.627/22, cláusula 6.7.1, a prestação de contas deveria ser entregue até o dia 10 do mês subsequente ao
vencimento do bimestre. Essa prestação de contas deveria ser entregue por meio da plataforma on-line do Município. Nesse sentido, o vencimento do bimestre se deu, conforme o governo, no dia 10/04, quando deveriam ter sido entregues as prestações de contas de fevereiro e março.
Aliás, a mesma previsão de prestação de contas, da cláusula 6.7.1. consta do contrato nº 10.879/22, inclusive no tocante a sistemática de entrega da prestação.

E o governo alega que “a AHBB nunca realizou de forma correta a prestação de contas dos valores que foram repassados. Por diversas vezes, foram realizadas reuniões, trocas de e-mails, notificações, apresentação de documentos entre outros, conforme relatório do setor de gestão do contrato”.

Conforme afirmado pelas gestoras do contrato, em audiência pública, “a AHBB jamais apresentou a sua prestação de contas de acordo com o que fora estabelecido no contrato firmado com a municipalidade, por meio do qual se comprometeu a apresentar notas fiscais relativas aos médicos, documentos comprobatórios do pagamento realizado aos funcionários, bem como do rateio das demais despesas”.

Ao Judiciário, a administração ainda argumenta que “a Secretaria de Saúde vem tentando, sem sucesso, obter a correta prestação de contas da AHBB desde março de 2022, relativamente ao primeiro contrato e, posteriormente, ao segundo contrato.

Mas, ainda em fevereiro de 2022, a organização emitiu uma única nota fiscal, com valor global, contrariando o disposto no contrato em relação a prestação de contas, reclama o Município.

MUDANÇAS E PROBLEMAS

Mas o “enrosco” não parou por ai.

Mas a Secretaria de Saúde descreve, na ação, que a  partir do mês de maio, a Associação passou a apresentar sua prestação de contas em parcial conformidade com o estabelecido no contrato. “Diante desse cenário, não restou alternativa à Administração senão “realizar o pagamento tão somente do valor correspondente as contas prestadas pela Requerida de acordo com o contrato, o que de fato ocorrera”.

O Município alega que, nesta fase, a contratada ainda não havia conseguido provar a prestação dos serviços da fase inicial. Lá do início do contrato…

A administração ainda lista problemas, desde o início, com treinamento e, na sequência, nos serviços (não prestados, segundo o governo). O curioso é que o Município também reconhece que foram diversos, inúmeros problemas e que “nunca” a AHBB cumpriu o contrato. Mas a contratou, mesmo assim, de novo. “A contratada nunca conseguiu apresentar uma prestação de contas que fosse integralmente aceita ou livre de problemas, sendo certo que chegou inclusive
a apresentar documentos que não guardavam qualquer relação com a execução do contrato para justificar valores”.

SALDOS

Ou seja, do contrato 1 a Prefeitura alega que não houve a comprovação de despesas de R$ 951.503,83.  O saldo cobrado e que deveria ter sido restituído ao Município é de R$ 315.741,35, desta fase. 

Então, para compreender os detalhes, é preciso separar os conteúdos levantados pelo governo em dois quadros. O do primeiro contrato está nesta tabela:

Para entender a tabela acima:

– O repasse do cronograma é o valor constante no contrato para transferência;

– O repasse efetivo foi o valor transferido para a conta do contrato;

– Os valores lançados no sistema referem-se a valores que a AHBB apresentou;

– O valor comprovado são as notas aceitas como justificativas para as despesas;

– Os valores não comprovados se referem às notas ou documentos que não foram aceitos pela carência de esclarecimento de seu vínculo direto e obrigatório, e sua necessidade à execução do objeto do contrato;

 – O saldo em conta é o valor que deveria constar na conta do contrato (acrescido aos devidos rendimentos).

CONTRATO 2

Mas teve o contrato 2, assinado em 14/07/2022, com início das atividades em 20/07 e com vigência de 90 dias, no valor de R$ 2.629.037,34. “Mas, da mesma forma como o primeiro contrato, as prestações de contas foram apresentadas com inconsistências, especialmente quanto as diversas
notas de serviços administrativos sem clareza de sua essencialidade para a execução do contrato”

Mas, neste caso, o governo diz que glosou (rejeitou) alguns lançamentos. “Assim, houve o desconto dos valores das notas referentes a serviços que
necessitavam de esclarecimentos e comprovações. A SEF, com base em parecer do Departamento de Auditoria, procedeu os descontos de ISS devidos das notas fiscais apresentadas pela AHBB”.

Veja a tabela relativa ao segundo  contrato:

Você acha que acabou? Não! O governo descreve que a AHBB teria rejeitado a ideia de emitir notas descontando valores pendentes. Isso já em setembro de 2022. Somente neste momento é que houve a interrupção dos repasses por não prestação de contas, de forma reiterada.

A Prefeitura ainda sustenta que, nesta fase, final, verificou que os valores retirados da conta corrente específica, mesmo sem prestação de contas, eram suficientes para verbas rescisórias etc. Desta segunda ação, o saldo apontado pelo governo é de R$ 923.854,57.

A ação vai para a contestação da AHBB. Contatamos interlocutor da empresa para apresentar sua manifestação. Estamos no aguardo.

 

Ação Vara da Fazenda Pública número 1003908-29.2023.8.26.0071

3 comentários em “Detalhamos o “enrosco” da cobrança milionária da Saúde contra a AHBB de Lins na Justiça”

  1. Diante desse quadro e das demais omissões da Prefeitura e da Secretaria Municipal de Saúde vocês acham por bem aprovar as contas do terceiro quadrimestre apresentado encima da hora sem tempo para avaliação?
    Dia 24 tem audiência pública na Câmara Municipal sobre esse assunto, participe e opine.
    Rose Lopes
    Membro do Conselho Municipal de Saúde de Bauru

  2. Está briga é entre Prefeitura e HBB..não é justo os trabalhadores ficar sem receber …trabalhei na linha de frente do covid..fui contaminada fiquei afastada ..tive febre alta e outras complicações..agora não é justo ficar sem receber ..temos nossas contas tive que trancar minha faculdade ..porque não recebi.a Doutora Alana na reunião pública ela citou que o serviço pela HBB era pra da uma qualidade de vida para a população..e nós técnico de enfermagem que qualidade de vida ela oferece para os trabalhadores que tb foi contaminado..e outra se estávamos na frente do covid foi por amor e respeito a nossa profissão e principalmente responsabilidade pela população que vai até os Upas com dor e buscam pela melhoras em amenizar o sofrimento..e eles merecem nosso respeito e solidariedade..e agora nós tb merecemos respeito..com nossa profissão..e esperamos que cumprem o que nos devem

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

error: Conteúdo protegido!
Rolar para cima