Justiça condena 7 por improbidade na licitação do cartel de sacos de lixo na Emdurb

Denúncia do Gaeco Bauru foi de combinação para fraudar licitações, caso conhecido como ‘cartel dos sacos de lixo” (imagem reprodução)

O Judiciário condenou por improbidade administrativa os denunciados no caso conhecido como “cartel dos sacos de lixo”, onde empresas combinaram a participação em licitação da Emdurb, em 2012. A fraude a licitação reconhecida na decisão do juiz da 2ª Vara da Fazenda Pública de Bauru, José Renato da Silva Ribeiro, é decorrente de ampla investigação do Núcleo Bauru do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado – Gaeco – na Operação Colludium. O contrato também foi anulado pela sentença.

Com exceção do então presidente da Emdurb, Nico Mondelli (absolvido por falta de provas de que tenha tido conhecimento prévio da fraude), todos os acusados foram condenados, solidariamente, ao ressarcimento integral do dano suportado pela empresa pública bauruense; a proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, – ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário -, pelo prazo de quatro anos.

Mas o Ministério Público já recorreu da sentença datada do último dia 18 de junho. O pedido junto ao TJ é de ampliação das penas e aplicação de multa individual pelas condutas irregulares. Os sentenciados contestaram a ação, seja no caminho de não reconhecer as irregularidades, seja pela estratégia de apontar que participaram da licitação, mas negando combinação e fraude.

O ESQUEMA

A decisão traz que ‘da análise detida dos fatos e dos documentos revela-se uma teia complexa e orquestrada de ações objetivando fraudar a lisura do Pregão Presencial nº 20/2012 da EMDURB, realizado para o fornecimento de diversos tipos de sacos plásticos”.
Assim, traz o juiz, a conduta dos corréus Francisco Aparecido Liduenha, Renan Francisco Liduenha, Felipe Antonio Araujo dos Santos, Roger de Souza Panato, Antônio Paulo Liduenha, Lucas da Silva Alcantara e Flavio Augusto Dini, conforme exaustivamente detalhado no excelente trabalho desenvolvido pelo Ministério Público, aponta para um cenário de clara violação aos princípios administrativos e à legislação pertinente.

O relatório do Procedimento Investigatório Criminal MP nº 94.0661.0000082/2012-2 elaborado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado GAECO Núcleo Bauru mostra que as “investigações evidenciaram a existência de um grupo organizado de pessoas físicas e jurídicas no intuito de praticarem diversos crimes contra o patrimônio de centenas de Municípios do Estado de São Paulo e mesmo em outros Estados, formado por Edison Antônio dos Santos, Rogério Lopes dos Reis, Francisco Aparecido Liduenha, Adilson Aparecido Lino, Luis André Forest, Carlos Ananias Campos de Souza e Ana Maria Liduenha, além de outros membros ainda não identificados”.
Destaca, ainda, a decisão que, “durante os trabalhos, por meio de documentos, áudios e e-mails interceptados, evidenciou-se um esquema elaborado para superfaturamento de certames licitatórios e ajuste para fraudar a competição, elegendo-se previamente a empresa vencedora da licitação, mediante pagamento de comissões aos demais participantes”.

O processo traz que a fraude se deu no processo com a participação na licitação das seguintes empresas: PAPA LIX PLÁSTICOS DESCARTÁVEIS LTDA representada por Felipe Araújo e Roger Panato; OKPLAST INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE EMBALAGENS representada por Antonio Paulo Liduenha; KID LIXO INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE MBALAGENS PLÁSTICAS representada por Francisco Liduenha e Renan Francisco Liduenha e IZZOPLAST RECICLAGEM E COMÉRCIO LTDA ME representada por Flávio Dini e Lucas Alcântara.
O juiz José Renato salienta que “em áudios captados (escuta telefônica com autorização judicial), verificou-se que houve prévio acerto para que a empresa KID LIXO fosse a vencedora do certame ocorrido na EMDURB, mediante pagamento de valores aos demais membros do grupo“.

Há menção expressa de Francisco Liduenha sobre a divisão fraudulenta de licitações, inclusive do pregão da EMDURB , bem como a discussão sobre a “compra” do pregão e o pagamento de 10% do valor aos outros participantes, o que comprova a premeditação e o caráter ilícito das ações, cita a decisão. “A ausência de disputa efetiva nos lances em vários itens, conforme bem apontado pelo Ministério Público, aliada à promessa de comissão aos demais, corrobora a tese de que o processo competitivo foi viciado”, acrescenta o juiz.
Quanto aos demais réus, Felipe Antonio Araujo dos Santos (PAPA LIX), Roger de Souza Panato (PAPA LIX), Antônio Paulo Liduenha (OKPLAST), Lucas da Silva Alcântara (IZZOPLAST) e Flavio Augusto Dini (IZZOPLAST), a alegação do Ministério Público de que apresentaram propostas superestimadas e se abstiveram de lances para favorecer a KID LIXO os vincula diretamente à fraude na licitação.
“É, portanto, evidente que houve dolo na conduta dos réus, que, mediante conluio, agiram para fraudar o pregão promovido pela EMDURB, mediante acerto prévio do vencedor, em esquema de rodízio entre os membros da organização criminosa e pagamento de comissões”, define a sentença local.

Ou seja, apurou-se a atuação de grupo criminoso que fraudava procedimentos licitatórios, mediante combinação ou ajuste, elevação arbitrária de preços e alteração de qualidade e quantidade das mercadorias entregues, também formando um cartel para venda e distribuição de sacos de lixo ao Poder Público.

E A AÇÃO PENAL?

Os fatos deram ensejo ao processo criminal nº 14247-45.2015.8.26.0071, que tramitou pela 4ª Vara Criminal de Bauru. A sentença em primeira instância entendeu que houve ajuste destinado a:

a) fraudar o caráter competitivo de um procedimento licitatório (pregão presencial n. 20/2012), promovido pela Empresa Municipal de Desenvolvimento Urbano e Rural de Bauru EMDURB, que tinha por objeto a aquisição de sacos de lixo;

b) causar, por meio dessa fraude, prejuízo à referida empresa pública, elevando arbitrariamente os preços dos produtos a serem vendidos. O pedido foi julgado parcialmente procedente para condenar os réus Francisco Aparecido Liduenha, Renan Francisco Liduenha, Felipe Antônio Araújo dos Santos, Roger de Souza Panato e Antônio Paulo Liduenha a penas de detenção e pagamento de multa por infração aos Artigos 96, inciso I e
90, ambos da Lei n. 8.666/93.

Ainda na ação penal, os corréus Lucas da Silva Ancântara e Flávio Augusto Dini foram absolvidos em primeira instância. Mas o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deu parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público para condená-los a pena de detenção e multa pelos mesmos delitos.

Desta forma, a sentença traz que “seja pela abundância de provas juntadas, seja pela condenação dos réus na esfera criminal, comprovada a prática do ato de improbidade administrativa”.

De outro lado, o juiz absolve Nico Mondelli, então presidente da Emdurb, da condenação por improbidade. O magistrado traz que não existe, no caso, comprovação de dolo, ou seja, de que o corréu sabia do prévio acerto entre os licitantes, ou de que os preços estavam em manifesto desacordo com os praticados no mercado. Ele confirmou a licitação baseado nos atos praticados pela Comissão do Pregão.

IMPROBIDADE

A recente alteração da lei federal de improbidade (agora 14.133/2021) – como ferramenta de atuação contra a corrupção ou prática de atos que geram prejuízo no setor público – tem dificultado o papel dos promotores. No comando da área de Cidadania e Patrimônio Público em Bauru há 25 anos, o promotor Fernando Masseli Helene, explica que agora a investigação tem de comprovar intenção no ato irregular, ilegal ou de má conduta (o chamado dolo).

A mudança se deu no governo de Jair Bolsonaro, com aprovação pelo Congresso. Até 2019, a lei de improbidade (8.429/92) alcançava gestores públicos omissos, negligentes ou que exerceram culpa em medidas que causaram prejuízo ou desvios nas administrações públicas. Agora o promotor tem de provar a intenção de errar. Além disso, as denúncias só podem ser geradas para fatos alcançados em até 5 anos da ocorrência. E, uma vez no Judiciário, as ações têm de ter decisão em até 8 anos (pelo menos no Fórum da cidade onde ocorreu o caso).

Se a fixação de prazo pressiona que processos deixem de tramitar “sem fim” no Judiciário, para os casos complexos de improbidade, ou corrupção, os períodos estabelecidos dificultam o caminho entre o andamento, investigação e finalização.

Do ponto de vista do mérito, a necessidade de comprovação de intenção no erro, ou conduta irregular (dolo) tem sido outro obstáculo na atuação da Promotoria. Isso, ao menos, no âmbito de processos onde se discutiam prejuízos ou erros flagrantes – como a obra contratada com erro, a execução de serviço ruim, a ausência de fiscalização das instalações, ou entrega com defeito, o preço praticado acima do mercado. Entre outros.

Nestes casos exemplificados, o promotor Fernando Masseli menciona que o caminho tem sido o de buscar ressarcimento do dano, ou sanções previstas na ação civil pública. Reparar o prejuízo. Ainda que o agente público que falhou, se omitiu, não seja alcançado pelo ato de improbidade administrativa.

 

ação de improbidade – 1025305-91.2016.8.26.0071

 

 

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