Justiça Criminal condena seis da família Mondelli por fraude e caixa 2

Funcionários tiveram passivo de R$ 7,5 milhões e falência apontou mais R$ 135 milhões em dívidas tributárias e outros R$ 49,4 milhões a pagar

A juíza Ana Carolina Achoa Aguiar Siqueira de Oliveira condenou os seis denunciados da família Mondelli pelos crimes de fraude contábil e caixa 2. Antonio Mondelli, Constantino, Braz, José, Vangelio (falecido) e Constantino Filho, todos do mesmo sobrenome familiar, receberam sentença em regime semiaberto. A pena imposta em primeira instância é de 5 anos, 8 meses e 18 dias a todos, com exceção de José (4 anos, 9 meses e 5 dias). Da condenação cabe recurso na ação com origem em denúncia do MP recebida em 2017 e que contém troca de acusações durante o processo que culminou com a falência do Frigorífico Mondelli.

Conforme a sentença, “muito embora todos os denunciados tenham negado conhecimento e/ou participação nas condutas descritas na peça acusatória, ora sustentando desconhecimento da existência das contas mencionadas na denúncia, ora sustentando não exercerem efetivamente poderes de gerência, a prova dos autos está a revelar o inverso”.
A condenação traz que de acordo com a alteração do contrato social datado de 07/06/2004, eram sócios quotistas da sociedade, à época, os réus Antonio Mondelli, Constantino Mondelli, José Mondelli , Braz Mondelli, além de Genaro Mondelli (já falecido) sendo certo que a todos foi concedido poderes de administração da sociedade, com exceção de José Mondelli.
Posteriormente, por ocasião do falecimento de Genaro Mondelli, em fevereiro de 2008, houve a alteração do contrato social conforme documento de fls. 4407/4432, datado de junho de 2008, momento em que foram concedidos poderes de administração do frigorífico ao inventariante Vangélio Mondelli e também a José Mondelli.

Assim, na condição de administradores da empresa, durante o período de apuração da contabilidade paralela e do lançamento de contabilidade inexata, anos de 2005 a 2011, certo que sabiam das movimentações bancárias a ela atinentes.
Em abril de 2011, dentro portanto do período de apuração da contabilidade paralela e do lançamento de dados contábeis com inexatidão, observa-se que já transformada a empresa em sociedade anônima, os denunciados continuaram com poderes de administração, sendo que Antônio Mondelli tomou posse na condição de Presidente do Conselho de Administração e José Mondelli no cargo de vice-presidente, participando os demais sócios Constantino Mondelli e Braz Mondelli como membros do Conselho Administrativo.

A sentença ainda descreve que, na mesma ocasião, Constantino Mondelli Filho foi nomeado como Diretor da sociedade juntamente com outros dois diretores. “Muito embora por ocasião de seu interrogatório, José Mondelli tenha pontuado que, por ser professor da Universidade de São Paulo, era impedido de exercer a administração da sociedade, o que explica o fato de não constar inicialmente do contrato social como administrador, nota-se que ao menos a partir de julho de 2008 passou a ostentar poderes de gerência e participar de forma ativa da administração da empresa”, decide a juíza.
Este fato se revela mais evidente, aponta, se considerarmos a prova documental.

No processo, depoimentos de contadores e funcionários confirmam retiradas e manipulação de valores que superam a R$ 100 milhões, com extratos e relatórios contábeis de fraude.

Os sentenciados, informa o processo,  desqualificaram a denúncia, acusaram a administração judicial de agir no interesse da falência, rejeitaram a ocorrência de fraude, alegaram falta de individualização das condutas e denúncia vazia.

Mas a magistrada elencou farta documentação, identificação de saques, confirmação de ação e conduta em conluio dos acusados e constatou as irregularidades.

PROVAS

A decisão condenatória descreve que “durante os anos de 2005 e 2011 todos os denunciados foram beneficiados com o recebimento de valores oriundos das contas bancárias não contabilizadas. A frequência dos repasses e os montantes envolvidos, melhor especificados nas planilhas de fls. 687/721, totalizando a quantia de R$ 7.164.854,61, não deixam dúvidas quanto ao pleno conhecimento da existência das contas correntes e anuência a tal movimentação, bem como da ausência de inclusão na contabilidade oficial.
O conhecimento e envolvimento de todos os denunciados veio a ser confirmado expressamente pela testemunha Marcos Ismanhoto e especialmente por Luiz Carlos de Souza Reis, este funcionário do setor financeiro do frigorífico. Reportaram as testemunhas que todos os sócios com poderes de administração, quer na época em que vivo estava Genaro Mondelli, maior sócio quotista, quanto após o seu falecimento em fevereiro de 2008, atuavam na gestão da empresa.

Luiz Carlos inclusive pontuou que após o falecimento de Genaro, todos os demais sócios passaram a atuar na administração do frigorífico, sem que houvesse um comando único como pretende fazer crer os denunciados. Mencionou referida testemunha que todos assinavam os documentos encaminhados ao setor financeiro na condição de administradores, sempre dois administradores conjuntamente.
Frise-se que embora José Mondelli alegue não ter percebido quaisquer valores, eis que estes teriam sido capitalizados na empresa, é certo que os documentos de fls. 694 e 2172/2174 comprovam o contrário, haja vista que existem pagamentos de pró-labore efetivados por cheque em seu favor oriundos da conta corrente pertencente à contabilidade paralela.

Relativamente ao réu Contantino Mondelli Filho, em que pese afirme em seu interrogatório ter dito ter sido apenas empregado da empresa, contratado no ano de 2004, inicialmente como assessor jurídico, a prova dos autos está a demostrar que também foi beneficiário dos valores recebidos via conta paralela R$ 103.540,78 (fl. 687).
Observa-se ainda da prova documental, que foi ele eleito como Diretor Institucional em abril de 2011 (fl. 4452/4454), contudo assinava como secretário em atas de deliberação ao menos desde junho de 2007 nas reuniões dos sócios quotistas (período em que já era beneficiário dos valores (fl. 690). “Não é demais destacar, ainda, que por ocasião da inquirição de testemunha, José Fernando Fontes, contador da empresa De Martino, reportou ele ter obtido informação junto ao contador interno da empresa, no sentido de que as jogadas contábeis realizadas para supervalorização do estoque eram feitas a mando da diretoria, sendo expressamente citado o nome do réu Constantino Mondelli Filho também como mandante, a comprovar seu envolvimento na conduta delituosa”, descreve a condenação.

Constantino Filho antecipou ao CONTRAPONTO, em 10/10, que vai recorrer. Ele considera que a juíza deixou de apreciar, em suas alegações finais (defesa), procedência em recurso de 2019, junto ao TJ, onde, na esfera cível, obteve o desbloqueio de bens (e valores) de sua pessoa física na ação que discutia o ressarcimento das obrigações e passivo. O recurso foi apreciado pelo relator no TJ, desembargador Grava Brazil. Ele reformou a sentença quanto ao bloqueio de bens pessoais em nome de Constantino e julgou improcedente, naquele recurso, o pedido de desconsideração da personalidade jurídica em relação a ele. Constantino disse que vai utilizar este agravo no recurso da matéria criminal.

Já com relação a Vangélio Mondelli, apesar das escusas apresentadas no sentido de que nunca atuou efetivamente na administração da empresa, não há dúvidas de que se apresentava como inventariante e responsável pela administração dos bens do espólio de Genaro Mondelli, representando as cotas sociais a ele referentes (alteração contrato social fls. 4409). E nesta condição a ele expressamente foram transmitidos poderes de administração nos termos da cláusula 8ª e seu parágrafo 2º (fls.4416).

Assim, evidentemente, decide a juíza, ostentava poderes de decisão ao representar o falecido proprietário e administrador Genaro Mondelli, maior cotista, não se cogitando da existência de dúvidas quanto ao seu conhecimento sobre a existência da contabilidade e sua anuência à manutenção desta prática durante anos, tudo a denotar o seu direto envolvimento na conduta delitiva.
“Não há como negar ainda o poder decisório de todos sobre a manutenção ou não desta contabilidade paralela, o que já se mostraria suficiente para embasar o decreto condenatório. Isto porque, se até o falecimento de Genaro Mondelli era ele quem em tese, de forma exclusiva comandava o frigorífico, com o óbito de Genaro, ocorrido em fevereiro de 2008, certo é que os demais cotistas proprietários passaram a gerir o frigorífico. E é importante pontuar que a movimentação bancária sem a pertinente contabilização oficial se estendeu entre os anos de 2005 a 2011. Assim, ainda que Genaro fosse o único a comandar o frigorífico até o seu falecimento, posteriormente a situação se alterou. Tanto é fato que procederam às alterações contratuais já destacadas e evidentemente a empresa precisou ser comandada e gerida por todos aqueles que ostentavam a condição de sócio administrador”, conclui a decisão.

O frigorífico foi adquirido, em leilão judicial, pelo grupo Zanchetta, durante processo de falência.

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

error: Conteúdo protegido!
Rolar para cima