O primeiro cachorro e a infância

 

A vida é feita de escolhas.

O simples resolve tudo!

Nascido de uma família de muitos filhos, do caminhoneiro seu Roque com dona Maria cheia de raça, vivi a infância em Itaberá, “pedra que brilha” em tupi, do ciclo do ouro dos Bandeirantes no extremo sudeste do Estado de São Paulo.

Infância bucólica, agrícola, com economia de subsistência em casa e arredores. Uma trajetória de identificação a milhões de brasileiros, mesmo depois do êxodo rural e urbanização das pequenas vilas, a partir da segunda metade do século passado no País.

Quem era do Interior e queria estudar, tinha de deixar sua terra natal e buscar centros maiores. Eis me em Bauru, na Unesp, em 1989…

A narrativa musical do período de infância está na canção Pedra brilhante de meu primeiro disco autoral.

Os versos contam histórias como a do Rabi, o cachorro pastor alemão de meu pai que me protegia enquanto minha mãe cuidava da casa e da “penca de filhos”. Sou o último de sete homens, sem contar as meninas…

Bom… segue a letra, abaixo. Mas a história cantada está aqui no CONTRAPONTO, no espaço MÚSICAS.

 

Pedra brilhante – link completo: https://www.youtube.com/watch?v=nxqL0wZVZ3o

Eu morei no Querosene, tinha um cruzeiro lá

O nome é das lamparinas e a cruz para rezar

Puxava água de carriola, no riozinho da Cruizinha

Perto do Mato do Bino que é reserva “frorestar”

O banho era na bacia e à luz de lampião

Fervia roupa com anil, passava escovão no chão

Só depois que veio o poço, pra beber e pra lavar

No quintal tinha latrina, mas também tinha pomar

 

E a mistura do almoço, muito vinha de plantar

No domingo tinha frango, eu ia pro Cafezar

Não faltava a uma missa, lá na praça da Matriz

No boteco do Pintico, na sinuca era feliz

 

A conta de caderneta, se pagava todo mês

Ganhava uma tubaína, porque o pai era freguês

Pulava brasa descalço, brincava de morto e vivo    

Da varinha de marmelo, da mãe vinha o corretivo

 

A família do Chanotte, doia no coração

Do barbeiro que espreitava, pela fresta do galpão

E no campo da paineira, a bola era de capotão

Não joguei no Bandeirantes, porque dava bicudão     

 

Mas fiquei “bão” de estilingue, caçava com o Zé Inês

Que treinava no palito, não errava uma vez

Saltava de galho em galho, pendurado no cipó

Eu ria com o Dito Térço, mas temia o Bobó      

 

E no time da coragem, tenho mais de “deiz” irmãos

Conto a turma do meu sangue, a do Auro e do Luizão

Saíram da encruzilhada, forjaram tudo com fé

Viveram seus desatinos, aqui não tem zé mané

 

Hoje tão longe, distante, relembro da pedra brilhante     

Da minha infância, da vida caipira em Itaberá 

Não julgue sem conhecer, não fale só de olhar

Essa vida é passageira, use seu tempo pra amar

 

O meu primeiro cachorro, me ajudou a engatinhar

Segurava no Rabi, para aprender a andar

Fiz paçoca de pilão, pamonha de milho verde

Em junho eu fiz quentão, já nadei no Rio Verde

 

Na sombra do mandiocal, eu brincava de carrinho

Tinha medo de trovão e do escuro do caminho

Jogava bola escondido, via o orvalho bem cedinho

Eu caçava vagalume, na invernada do vizinho

Imitava bem-te-vi, tantos outros passarinhos

Brincava de rolemã, de peão, de teatrinho                  

Desde cedo rabiscava, meus versos num caderninho

Eu nunca imaginava, tocar no meu próprio pinho

 

Hoje tão longe, distante, relembro da pedra brilhante    

Dancei quadrilha na festa junina que tinha por lá

Não julgue sem conhecer, não fale só de olhar

Essa vida é passageira, use seu tempo pra amar

3 comentários em “O primeiro cachorro e a infância”

  1. Sensacional Nélson. A cada dia torno-me um fiel admirador de suas pautas e suas canções. Essa me remeteu a minha infância, cidade pequenina, infância feliz. Forte abraço e fica com Deus.
    Cordialmente,
    Miguel Minozi.

  2. Show bauru deveria ter um espaço para assistir o show de pessoas que realmente canta e toca musicais que trazem lembras da nossas infância. Adorei grata por me enviar .

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