Por Gustavo Cândido
O filme brasileiro “Ainda Estou Aqui”, dirigido por Walter Salles, tem conquistado plateias do mundo todo não só por sua qualidade como obra cinematográfica. Além da narrativa emocional com todos os elementos técnicos de primeira, o filme também pode ser considerado um estudo de caso exemplar sobre estratégias de marketing e comunicação.
Desde sua estreia, o longa tem acumulado uma bilheteria recorde no Brasil e recebido prêmios importantes – o último, o inédito Globo de Ouro de Melhor Atriz de Drama, para Fernanda Torres – além de gerar discussões e engajamento em diversas plataformas. Quando entrevistada, a atriz não deixa de citar o árduo trabalho de divulgação que tem feito pelo mundo ao lado do diretor e de Selton Mello, seu parceiro na tela, mostrando que não basta um bom produto para ter sucesso, é preciso saber mostrá-lo para o público.
A seguir eu destaco as principais táticas e escolhas que têm contribuído para o sucesso do filme. Acompanhe:
Posicionamento claro e diferenciação de mercado
Um dos fatores mais importantes para o sucesso de “Ainda Estou Aqui” foi o posicionamento claro do filme. Desde o início, a equipe de marketing enfatizou que se tratava de uma obra sensível e universal, explorando temas de perda, redenção e conexões humanas. Em um mercado saturado por blockbusters e filmes de ação feitos para o público jovem, “Ainda Estou Aqui” se destacou como uma alternativa emocionalmente impactante, atraindo públicos em busca de narrativas mais profundas e significativas.
Essa diferença foi reforçada em todos os materiais promocionais, desde os trailers até os pôsteres, que destacavam o tom intimista e a proposta estética diferenciada. Mesmo abordando um momento específico da história do Brasil – o período no qual a ditadura militar foi mais violenta – o apelo a temas universais permitiu que o filme transcendesse barreiras culturais, tornando-se relevante tanto para audiências brasileiras quanto internacionais.
Timing de lançamento e participação em festivais
A estratégia de lançamento também foi um elemento-chave. Antes de chegar às salas de cinema, “Ainda Estou Aqui” foi exibido em importantes festivais de cinema do mundo, como os de Veneza e Toronto. Esses eventos não apenas geraram credibilidade para a produção (premiada em ambos), mas também criaram um burburinho inicial essencial para atrair a atenção da mídia e do público.
O timing do lançamento comercial também foi estrategicamente calculado, coincidindo com um período de maior procura por experiências culturais e em um momento de menor concorrência com blockbusters – geralmente lançados no verão do hemisfério norte, no meio do ano. Essa escolha permitiu que o filme dominasse conversas nas redes sociais e alcançasse um bom desempenho nas bilheterias.
Nesse quesito é importante destacar a importância do distribuidor internacional do filme, a Sony Classics, uma divisão da gigante Sony Pictures, que garantiu que o filme alcançasse públicos fora do Brasil, ampliando sua visibilidade global.
Redes sociais e storytelling
As redes sociais têm desempenhado um papel central na campanha de marketing do filme. A equipe de comunicação da produção e da Sony investiu fortemente em conteúdos que gerassem conexão emocional com o público, como vídeos dos bastidores, depoimentos do elenco sobre o processo criativo e até falas de Marcelo Rubens Paiva, autor do livro no qual o filme se baseia e também um dos personagens retratados na trama.
O marketing do longa foi construído em torno de um storytelling forte e coerente. Desde os trailers até os posts nas redes sociais, toda a comunicação reforçava os temas principais do filme e destacava sua proposta única, o que foi reverberado pela opinião de influenciadores, críticos de cinema, jornalistas e personalidades.
Essa consistência ajudou a criar uma experiência unificada para o público, aumentando a lembrança da marca e gerando um engajamento natural potencializado pelo sucesso que “Ainda Estou Aqui” foi ganhando nos eventos internacionais, principalmente com o destaque de Fernanda Torres. Mesmo antes de ser premiada, a atriz – conhecida pela inteligência e bom humor sempre presentes em suas falas – já havia inundado as timelines com memes de personagens que interpretou na TV e looks de suas participações nos “tapetes vermelhos” pelo mundo.
Foco na experiência do consumidor
Outra lição a ser aprendida com “Ainda Estou Aqui” é a importância de proporcionar uma experiência memorável para o público. Além de uma campanha promocional bem elaborada, a distribuição do filme foi acompanhada de eventos especiais, como sessões com debates e encontros com o elenco e o diretor, principalmente fora do Brasil.
Essas experiências não apenas aumentaram o engajamento do público, mas também geraram conteúdo compartilhável nas redes sociais, ampliando o alcance da campanha. Na medida em que o filme foi ganhando elogios da crítica especializada a coisa decolou.
O longa foi apontado como obra imperdível por especialistas renomados de diversos países, o que gerou um efeito de boca a boca positivo, essencial para atrair audiências.
Oscar: se a indicação vier os resultados podem ser ainda melhores
“Ainda Estou Aqui” está na disputa de várias premiações importantes pelo mundo. Com a vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro, as chances de o filme e da própria atriz serem indicados ao Oscar – o principal prêmio do cinema mundial – cresceram muito. Caso se confirmem, o nível de exposição da obra e dos seus envolvidos será catapultado às alturas.
Só no Brasil, o filme já foi visto por mais de 3 milhões de pessoas. Após o sucesso no Globo de Ouro, a produção que estava em cartaz em 145 redes de cinema do país, sendo exibida em 187 salas, já está 350 estabelecimentos e 400 salas. Até o livro de Marcelo Rubens Paiva voltou a fazer sucesso nas livrarias virtuais.
Você já assistiu “Ainda Estou Aqui”? Vale muito a pena, como cinema, como obra de arte para a reflexão sobre o horror da ditadura e também como aulinha de marketing. Recomendo!