Reforma: governo anuncia que cidadão poderá escolher de quem vai comprar energia elétrica

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A reforma de regras de custo, comercialização e subsídio no setor elétrico no País, anunciada esta semana em Brasília (DF), tem dois pontos principais que afetam a vida de todos. Um é a ampliação da tarifa social. Outro é a promessa de garantir que o consumidor compre de quem quiser a energia (mercado livre e portabilidade).

O Ministério de Minas e Energia divulgou no último dia 16 de abril a minuta de projeto de lei que promove mudanças no modelo comercial do setor elétrico, com destaque para a promessa de abertura completa do mercado de energia elétrica no Brasil. As propostas em discussão no âmbito do governo federal serão encaminhadas para o Congresso Nacional.

Isenção. Do primeiro ponto importante das medidas, o governo enfatizou (claro) que até 60 milhões de brasileiros passarão a alcançar benefícios da tarifa social (leia abaixo). Veículos de linha editorial de direita, como a Revista Oeste, destacaram que o custo da ampliação da isenção vai encarecer a conta para os demais em 1,4%.

A mídia mais simpática ao governo Lula enfatizou maior “justiça social” com a redistribuição e o efeito sobre as camadas mais pobres, como a Carta Capital. Outras mídias, como o Valor Econômico, mesclaram o aumento da faixa de isenção compensada com a revisão de incentivos no setor embutidos na conta atual.

Mercado livre. O segundo ponto relevante é que as medidas anunciadas, em geral, enfrentam uma questão pendente e aguardada há três décadas no Brasil: a universalização do acesso ao mercado livre de energia elétrica, dando a todos os consumidores, inclusive os residenciais e pequenos negócios, o “direito de fazer a portabilidade da conta de luz e assim poder escolher o fornecedor e as características desse fornecimento, o que, na ponta do lápis, pode render economia mensal de até 30% da fatura elétrica”, citou o governo.

Mas o que pensa o setor? Por exemplo, a Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia. Segundo Rodrigo Ferreira, presidente-executivo da Abraceel, que defende a abertura completa do mercado de energia elétrica há 25 anos, “a proposta apresentada busca dar a todos o mesmo direito. Qual justificativa para, por exemplo, apenas uma parte da indústria ter acesso ao mercado livre?”, questiona, já que o acesso ao mercado livre de energia é restrito apenas ao Grupo A – que reúne consumidores de energia em média e alta tensão, parcela que representa menos de 1% de todos os consumidores.

Para o presidente da Abraceel, a busca por maior igualdade de direitos é um ponto forte no projeto apresentado pelo Ministério de Minas e Energia. “O setor elétrico é repleto de desigualdades e elas afetam a desigualdade social do país como um todo. É um momento para corrigir isso.”

Rodrigo Ferreira, presidente da Abraceel

Para a Abraceel, a abertura completa do mercado de energia elétrica no Brasil é uma política pública que atinge todas as categorias de consumidores de energia, como residências, pequenos negócios, segmentos industrial e comercial e produtores rurais.

Assim, “a liberalização do mercado de energia para os consumidores do Grupo B pode gerar para esses economia de R$ 35,8 bilhões por ano na conta de energia elétrica, em comparação ao valor desembolsado atualmente, redução média de 23% a preços de 2023, o que contribuirá para aliviar a pressão inflacionaria”, avalia. Os números fazem parte do estudo “Portabilidade da conta de luz: impacto social e papel na transição energética justa”, lançado pela Abraceel ainda em maio de 2023. Acesse aqui: https://abraceel.com.br/biblioteca/apresentacoes/2023/05/portabilidade-da-conta-de-luz-justica-social-e-transicao-energetica-justa/

O estudo mostra que há um “Brasil esquecido”, formado por consumidores que não foram alvo de políticas públicas recentes para reduzir estruturalmente o custo da energia elétrica nos últimos anos, pois são consumidores que não se encaixam nas regras de acesso à tarifa social e ao mercado livre de energia, tampouco têm recursos próprios, capacidade de crédito ou telhado para instalar sistemas de geração distribuída solar fotovoltaica.

150 MILHÕES

Os “esquecidos” somam mais de 150 milhões de brasileiros, agrupados em cerca de 73 milhões de unidades consumidoras, que incluem as famílias de classe C e D e mais de 90% dos pequenos comércios, indústrias e empreendedores rurais, importantes geradores de emprego e renda no nosso país.

Outros setores – Na visão da Associação, os benefícios da liberalização do mercado seriam disseminados para outras categorias importantes, como a classe média e pequenos negócios, comércios, produtores rurais e indústrias, que compõem um “Brasil esquecido” que soma 150 milhões de brasileiros em 73,5 milhões de unidades consumidoras que não têm sido alvo de políticas públicas estruturantes para reduzir o custo da conta de eletricidade nos últimos anos.

Classe média – Os brasileiros da classe média seguem ‘fora das regras’, mesmo representando cerca de 90% dos domicílios e 70% do consumo residencial. “Com a abertura completa do mercado de energia para a competição, esse grupo pode ser beneficiado com desconto total de R$ 22,7 bilhões por ano nas suas contas de eletricidade em comparação ao que pagam atualmente”, defende a Abraceel.

Já os setores rural, comercial e industrial podem reduzir R$ 10,7 bilhões em custos com abertura do mercado de energia, segundo o estudo. Os três segmentos têm cerca de 11 milhões de unidades consumidoras no país que podem se beneficiar com a concorrência derivada do direito de escolha. Os benefícios chegariam principalmente aos consumidores de menor porte, que formam a maior parcela desse grupo

Produtores rurais – O estudo mostra que 4,5 milhões de unidades consumidoras de energia no setor rural poderiam reduzir o valor da conta de energia em R$ 2,8 bilhões ao ano em comparação aos preços pagos atualmente no mercado regulado. A universalização do direito de escolher o fornecedor de energia tem potencial de beneficiar principalmente um conjunto de mais de 3,4 milhões de pequenos produtores, com fatura mensal inferior a R$ 285,00.

Emprego – outra vertente aposta na ampliação de investimentos no setor.  Na avaliação da Associação entre os que comercializam energia os consumidores dos segmentos industriais e comerciais tendem a reinvestir os recursos obtidos com economias na conta de luz em melhorias nas instalações e processos e também na contratação de pessoal.

Essa avaliação consta em estudo “Mercado livre de energia – Benefícios para Indústria e Comércio”, lançado em maio de 2024. Acesse: https://abraceel.com.br/biblioteca/estudos/2024/05/mercado-livre-de-energia-beneficios-para-industria-e-comercio/

“A redução de custos na compra da energia, além de gerar economia aos consumidores e novos empregos, traz outro importante benefício macroeconômico, que é desacelerar a inflação, já que a energia elétrica é um dos principais itens da cesta de produtos e serviços que compõe o IPCA”.

Raio-X da indústria

No segmento industrial, o estudo identificou que o Brasil conta com 492,8 mil unidades consumidoras de energia, que demandam 24,8 GW médios.

Dessas, 37,4 mil (22,7 GW médios), entre as maiores indústrias brasileiras, já estão no mercado livre de energia.

Adicionalmente, outras 44,7 mil (1,6 GW médios) estão aptas a comprar energia do fornecedor que escolher, pois atendem requisitos para migrar do mercado regulado ao livre.

Restam 410,7 mil consumidores industriais (471 MW médios), que consomem energia em baixa tensão, que estão alijados dessa alternativa para reduzir gastos com eletricidade.

Considerando as mais de 455 mil unidades consumidoras do segmento industrial que ainda estão no mercado regulado, os benefícios com a migração para o mercado livre somam R$ 4,2 bilhões em redução de custos por ano e mais de 91 mil novos empregos, disseminados por todos os estados brasileiros, especialmente em São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Raio-X do comércio

No segmento comercial, o estudo identificou que o Brasil conta com mais de 6,1 milhões unidades consumidoras de energia, que demandam 8,0 GW médios.

Dessas, apenas 2 mil (647 MW médios), entre os maiores estabelecimentos comerciais brasileiros, já estão no mercado livre de energia.

Adicionalmente, outros 77 mil (2.133 MW médios) estão aptos a comprar energia do fornecedor que escolher, pois atendem requisitos para migrar do mercado regulado ao livre.

Assim, restam mais de 6,0 milhões de consumidores comerciais, que consomem energia em baixa tensão, que estão alijados dessa alternativa para reduzir gastos com eletricidade.

Considerando os 6,0 milhões de unidades consumidoras do segmento comercial que ainda estão no mercado regulado, os benefícios com a migração para o mercado livre somam R$ 13,5 bilhões em redução de custos por ano e até 290 mil novos empregos, disseminados por todos os estados brasileiros, especialmente em São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Paraná e Ceará.

GOVERNO: MEDIDAS VÃO BENEFICIAR MAIS 16 MILHÕES 

O governo federal destacou sua visão sobre as medidas em reportagem oficial na Agência Brasil. Veja o que diz o governo:

“A ampliação da tarifa social amplia benefícios. Hoje o programa oferece descontos no pagamento da conta de energia para indígenas, quilombolas, idosos que recebem Benefício de Prestação Continuada (BPC) e famílias inscritas no Cadastro Único (CadÚnico) do governo federal com renda até meio salário único..

A ideia é dar isenção de pagamento de tarifa de energia elétrica para essas populações para consumos de até 80 kWh por mês, o que chegaria a 60 milhões de pessoas no país no total.”

A ampliação seria de 16 milhões de consumidores. Atualmente, a isenção completa do pagamento em caso de consumo de até 50 kWh vale para indígenas e quilombolas, enquanto os idosos com BPC e as famílias do CadÚnico têm direito a descontos escalonados de até 65%, caso o consumo seja menor que 220kWh.

“Mais de 60 milhões de brasileiras e brasileiros serão beneficiados com a gratuidade de energia do consumo até 80 gigawatt por mês. Isso representa o consumo de uma família que tem uma geladeira, um chuveiro elétrico, ferro de passar, carregador de celular, televisão, lâmpadas para seis cômodos”, disse o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em evento no Rio de Janeiro, nesta semana

O ministro não explicou sobre o que será feito em relação aos descontos escalonados que hoje são aplicados para consumos até 220 kWh. Segundo ele, a ideia é subsidiar a política através da correção de “distorções internas do setor”.

Uma das distorções, de acordo com Silveira, é o pagamento sobre a segurança energética. “O pobre paga mais que o rico na questão, em especial, da segurança energética, para se pagar Angra 1 e 2 e as térmicas. Só o pobre paga. Boa parte do mercado livre não paga por essa segurança energética ou paga pouco. Então, estamos reequilibrando essa questão do pagamento por parte do pobre, do mercado regulado e da classe média”, disse.

 

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