O plenário do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ) recebeu na última sexta-feira dezenas de prefeitos, deputados e as direções do próprio TJ, Tribunal de Contas do Estado (TCE), Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e, ainda, do Supremo Tribunal Federal (STF). Na agenda a assinatura de cooperação técnica e administrativa que eliminar milhares de ações de devedores (execuções fiscais) do Judiciário. A medida, comemorada pelo CNJ e Judiciário, de fato vai desafogar a Justiça, sobretudo para uma enxurrada de cobranças de pequeno valor realizadas por prefeituras. Mas a medida também exige mudança e busca de eficiência dos municípios ao cobrar devedores.
De outro lado, as medidas impostas pelo CNJ e Supremo, a partir de Brasília (DF), dão força ao caixa dos Cartórios e exigem transformação das unidades de Auditoria e Execução Fiscal das Prefeituras. Para especialistas, as pequenas cidades – milhares e maioria no País – vão sofrer perdas na arrecadação, sobretudo de tributos municipais como IPTU e ISS.
Outra questão é saber se, abrindo mão do Judiciário, as prefeituras vão contratar empresas de cobrança para fazer o mesmo serviço – hoje realizado por procuradores jurídicos.
Veja os pró e contra listados por especialistas em Execução Fiscal, conforme apuração do CONTRAPONTO.
Bauru está entre as 81 prefeituras que aderiram ao Termo (veja lista ao final) – gerando cronograma de extinção de mais de 50 mil processos de execução fiscal que já estão no Judiciário, até 2026. Conforme o Termo assinado pela prefeita Suéllen Rosim em São Paulo, na sexta-feira (10/05), o programa visa reduzir o volume de ações de execução contra devedores no Judiciário e, ainda, “promover a digitalização dos processos que ainda tramitam no meio “físico” após a averiguação pelo Cartório do Setor de Execução Fiscal, que informará quais feitos não foram digitalizados pela empresa contratada pelo Município”.
Para tanto, a Procuradoria do Município (de todos que aderiram) deverá requerer a extinção das execuções fiscais físicas em caso de débitos liquidados, cancelados, prescritos ou remitidos, e ainda desistir dos feitos com valor abaixo do piso de ajuizamento, de acordo com Lei Municipal, bem como aqueles sem citação há mais de 1 ano e sem penhora efetivada.
E BAURU?
Bauru aderiu ao programa. De pronto, isso significa a extinção de boa parte das pouco mais de 51 mil ações de execução fiscal em andamento no Judiciário. Pelo menos 30 mil casos são de valores de até R$ 1.000,00. A outra parte é de cobranças de até R$ 10 mil.
O Plano de Trabalho assinado descreve a programação e o detalhamento dos procedimentos necessários:
1.1 – à extinção em bloco de processos de execução fiscal de que trata a Resolução CNJ n. 547, de 22 de fevereiro de 2024;
1.2 – à organização da sequência de aplicação das demandas relativas ao Projeto Execução Fiscal Eficiente TJSP, com a devida comunicação por meio de listas prévias e posteriores;
1.3 – ao compartilhamento de informações entre o sistema da dívida ativa do Município de Bauru e o sistema de processo eletrônico do TJSP;
1.4 – à tramitação prioritária de execuções fiscais contra devedores com CNPJs e CPFs ativos;
1.5 – ao saneamento e digitalização de execuções fiscais físicas por meio de empresa já contratada pelo Município de Bauru.
CRONOGRAMA:
– Análise dos processos de execução fiscal no valor de até R$ 1.000,00 (mil reais), na data da destruição, finalizando em dezembro/2024 –;
– Análise dos processos de execução fiscal no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) até R$ 3.000,00 (três mil reais), na data da destruição, finalizando em julho/2025;
– Análise dos processos de execução fiscal no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) até R$ 5.000,00 (cinco mil reais), na data da destruição, finalizando em dezembro/2025;
– Análise dos processos de execução fiscal no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) até R$ 10.000,00 (dez mil reais), na data da destruição, finalizando em dezembro/2026.
PRÓ E CONTRA
Consultamos profissionais de Auditoria e Execução Fiscal com larga experiência no setor. Ouvimos também, sob garantia da não identificação, consultores técnicos de contas sobre as medidas. A seguir, pontos essenciais, com vantagens e apontamentos de prejuízos com a adoção do programa no País:
O programa beneficia maus pagadores, mas também beneficia, em si, uma infinidade de pessoas com problemas financeiras e que não reúnem condições efetivas de pagar? SIM!
São ações de pequeno valor, onde o Judiciário e o Poder Executivo argumentam que o custo para executar (da fase inicial de inscrição em dívida ativa até as medidas por procuradores jurídicos) é, em muitos casos, maior do que o próprio valor devido? SIM!
Milhares de Prefeituras sequer conseguem notificar e encontrar devedores, porque mantêm cadastros (fiscais) incorretos de contribuintes? SIM!
Um volume número significativo de ações sequer tem movimentação, mesmo após 1 ano tramitando, e não resultam em arrecadação? – isso é chamado de prescrição intercorrente pelo Judiciário – SIM!
…
Prefeituras terão perdas na arrecadação com a eliminação exatamente de execuções judiciais contra devedores que, na prática, veem no Judiciário a forma efetiva de serem compelidos a pagarem? SIM!
Os Municípios de pequeno porte são maioria (esmagadora no Brasil). E, com isso, a maior parte de registros de dívidas não recebidas (chamada de dívida ativa) é exatamente de pequeno valor, significando a medida perda considerável de valores hoje já inscritos e, daqui pra frente, redução potencial em receitas? SIM!
Nas cidades pequenas e até de médio porte, os valores de IPTU e de aplicação de multa estão na faixa do programa (de até R$ 1 mil). A medida gera extinção de receita, mesmo para IPTU acumulado devido por até cinco anos, porque em muitos casos o valor é de até R$ 200,00 por ano? SIM!
Além desses fatores, para procuradores jurídicos ocorrerá a extinção de todas as ações em andamento e não será mais possível entrar com ação em valores acima disso se não for comprovado o protesto extrajudicial e a tentativa de acordo extrajudicial.
Obviamente os cartórios de protestos terão um incremento na sua receita em razão do grande número de devedores de tributos municipais.
Além disso, o contribuinte sabendo que não será mais executado judicialmente terá mais um motivo para não pagar seus débitos.
LISTA DAS CIDADES
Os municípios que aderiram nesta etapa são:
– Altinópolis
– Alvinlândia
– Angatuba
– Araras
– Barra do Turvo
– Barretos
– Batatais
– Bauru
– Bofete
– Bom Sucesso de Itacaré
– Botucatu
– Cabreúva
– Cachoeira Paulista
– Caieiras
– Campinas
– Cananéia
– Capela do Alto
– Caragatatuba
– Catiguá
– Cesário Lange
– Cosmópolis
– Cravinhos
– Cunha
– Embu-guaçu
– Estrela do Norte
– Ferraz de Vasconcelos
– Guararapes
– Guareí
– Guarulhos
– Guzolândia
– Iacanga
– NGA
– Iguape
– Indiana
– Itapecerica da Serra
– Itapevi
– Itaquaquecetuba
– Itu
– Jacupiranga
– Jundiaí
– Juquia
– Lorena
– Manduri
– Martinópolis
– Micaratu
– Mongaguá
– Murutinga do Sul
– Naradiba
– Novais
CNJ, TCE e TJ ENFATIZAM EXTINÇÃO DE 2 MILHÕES DE AÇÕES
O acordo de cooperação técnica com o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) visa a extinção de execuções fiscais consideradas ineficazes. Ao todo, 81 municípios aderiram. O acordo envolve Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Procuradoria Geral do Estado e o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), que assinaram os Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) para o programa Execução Fiscal Eficiente, que viabilizarão a extinção de cerca de dois milhões de processos de execução fiscal no Estado ao longo dos próximos 12 meses.
O evento aconteceu no Salão Nobre do Palácio da Justiça, em São Paulo, com a participação do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso; do presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Fernando Torres Garcia; do Secretário de Justiça e Cidadania, Fabio Prieto, representando o governador Tarcísio de Freitas; da procuradora-geral do Estado, Inês Maria dos Santos Coimbra; do presidente do Tribunal de Contas do Estado, Renato Martins Costa, dos prefeitos dos Municípios participantes e integrantes do Conselho Superior da Magistratura.
O QUE SÃO
Execuções fiscais são processos ajuizados pelo Poder Público para a cobrança da chamada dívida ativa, que são os débitos para com a Fazenda que não foram pagos, como é o caso, por exemplo, das dívidas não adimplidas de IPTU, ISS e ITBI. Elas de fato consomem a maior parte da máquina da Justiça. Em São Paulo, dos 20,4 milhões de processos em andamento, 61% são execuções fiscais – 12,8 milhões, mas a maior parte cobra dívidas com valores inferiores ao próprio custo do próprio processo de execução, que é de R$ 10 mil, de acordo com estudo da Fipe, ou os devedores não têm bens penhoráveis.
A definição jurídica e administrativa para as medidas veio de Brasília. O Tema 1.184, julgado recentemente pelo STF, obriga os entes públicos a tomarem medidas quanto às dívidas de baixo valor, e permite à Justiça extinguir as respectivas execuções imediatamente.
A Resolução 547 do CNJ e a Portaria 2.738/24 do TJ-SP viabilizam a extinção de execução fiscal com valor inferior a R$ 10 mil, desde que esteja há um ano sem movimentação útil, sem citação ou sem apreensão de bens – as normas também passaram a exigir o uso do protesto para a cobrança do tributo antes do ajuizamento de novas ações.
COBRANÇA DE DEVEDORES: CALCANHAR DE AQUILES DO JUDICIÁRIO
O Judiciário brasileiro é caro. Um dos que mais custam no mundo. E a eficiência, produtividade, são itens que incomodam. Neste capítulo, historicamente as execuções fiscais são apontadas como o principal fator de morosidade do Poder Judiciário. O processo de execução fiscal chega ao Poder Judiciário depois que as tentativas de recuperação do crédito tributário se frustraram na via administrativa, provocando sua inscrição na dívida ativa.
Dessa forma, o processo judicial acaba por repetir etapas e providências de localização do devedor ou patrimônio capaz de satisfazer o crédito tributário já adotadas, sem sucesso, pela administração fazendária ou pelo conselho de fiscalização profissional. Acabam chegando ao Judiciário títulos de dívidas antigas ou com tentativas prévias de cobranças e, por consequência, com menor probabilidade de recuperação.
Os processos de execução fiscal representam, aproximadamente, 34% do total de casos pendentes e 64% das execuções pendentes no Poder Judiciário, com taxa de congestionamento de 88%.
Ou seja, de cada cem processos de execução fiscal que tramitaram no ano de 2022, apenas 12 foram baixados. Desconsiderando esses processos, a taxa de congestionamento do Poder Judiciário cairia em 6 pontos percentuais, passando de 72,9% para 66,9% em 2022.
O maior impacto das execuções fiscais está na Justiça Estadual, que concentra 85% dos processos. A Justiça Federal responde por 15%; a Justiça do Trabalho por 0,17%; e a Justiça Eleitoral por apenas 0,01%.
Da mesma forma, o impacto desses processos nos acervos é mais significativo na Justiça Estadual e na Federal. Na Justiça Federal, os processos de execução fiscal correspondem a 39% do seu acervo total de primeiro grau (conhecimento e execução); na Justiça Estadual, a 38%; na Justiça do Trabalho, a 1%; e na Justiça Eleitoral, a 1%.
O Poder Judiciário contava com um acervo de 81 milhões de processos pendentes de baixa no final do ano de 2022, sendo que mais da metade desses processos (52,3%) se referia à fase de execução. Os dados mostram que, apesar de ingressar no Poder Judiciário quase duas vezes mais casos em conhecimento do que em execução, no acervo a situação é inversa: a execução é 34,9% maior.
Na execução, as curvas de processos baixados e novos seguem quase paralelas, com pequeno distanciamento entre elas entre os anos de 2009 a 2017, sendo a baixa pouco menor que a demanda. A partir de 2018 até 2022, os valores passam a ficar quase iguais, o que revela avanços na produtividade da execução nos últimos 5 anos.
Em 2022, foram baixados 643 mil casos a menos do que o total de casos novos. Já no conhecimento, as curvas se mantiveram semelhantes somente até 2014, após, de 2015 a 2019, observa-se descolamento, com incremento anual na produtividade e com redução dos processos ingressados. Em 2020, a curva de baixados no conhecimento passa pela primeira vez a permanecer abaixo da curva de casos novos de conhecimento, fato que se repete em 2021 em 2022, no último ano quase se igualando.
A maior parte dos processos de execução é composta pelas execuções fiscais, que representam 64% do estoque em execução. Esses processos são os principais responsáveis pela alta taxa de congestionamento do Poder Judiciário, representando aproximadamente 34% do total de casos pendentes e congestionamento de 88% em 2022.
Há de se destacar, no entanto, que há casos em que o Judiciário esgotou os meios previstos em lei e ainda assim não houve localização de patrimônio capaz de satisfazer o crédito, permanecendo o processo pendente. Ademais, as dívidas chegam ao judiciário após esgotados os meios de cobrança administrativos, por isso a difícil recuperação.
Nesse contexto, a análise das taxas de congestionamento líquidas e brutas são relevantes, pois nessa fase o processo permanece pendente, com status de suspensão, deixando de impactar na taxa de congestionamento líquida (sem suspensos ou sobrestados ou em arquivo provisório).
O impacto da execução é significativo principalmente nos segmentos da Justiça Estadual, Federal e Trabalhista, correspondendo, a respectivamente, 55,3%, 43,6%, e 46% do acervo total de cada ramo, conforme aponta o quadro a seguir.
Porém, conforme acima, é importante esclarecer que a taxa de congestionamento na execução penal deve ser lida com cautela, pois os altos valores alcançados não caracterizam baixa eficiência do Poder Judiciário; significam tão somente que as execuções estão sendo cumpridas, uma vez que, enquanto a pena do condenado estiver em execução, o processo deve permanecer no acervo.
Dessa forma, a taxa de congestionamento dessa fase não pode ser avaliada como um indicador de desempenho. Vale informar, ainda, que o número de processos em execução penal difere do total de presos, já que um mesmo indivíduo pode ser réu em mais de um processo, assim como um mesmo processo pode ter mais de um réu preso.