Consultoria jurídica diz que projeto da concessão do esgoto é ilegal ao tirar receitas do DAE e prever uso de verba da ETE para drenagem

Parecer do consultor jurídico da Câmara, Arildo Lima Júnior, aponta 3 pontos ilegais no projeto de concessão

O consultor jurídico do Legislativo, Arildo Lima Júnior, apresentou à Comissão de Justiça parecer com três pontos de ilegalidade ao projeto de lei da prefeita Suéllen Rosim que pede autorização para a concessão do tratamento de esgoto e serviços adicionais em Bauru.

Em síntese, a manifestação que será apreciada pelos membros da Comissão indica que, primeiro, o projeto busca autorização através de lei ordinária para atribuição de serviço e gestão que estão estabelecidos também na Lei Orgânica (LOM).

LEI ORGÂNICA

Embora não seja explícito neste ponto, o consultor relata em seu parecer que a LOM “é a Constituição Municipal”. Assim, uma lei ordinária não tem poder de altera-la. O CONTRAPONTO ouviu de operadores do Direito Pùblico que seria necessário alterar a Lei Orgânica de forma específica e, então, modificar as leis municipais que tratam da regulamentação do tema, como a que criou o DAE e o Código Sanitário Municipal.

VERBA CARIMBADA

O segundo ponto do parecer trata da vinculação de receita do Fundo Municipal de Tratamento de Esgoto (FMTE). Aponta Lima Júnior que o bauruense passou a pagar especificamente, em meados de 2006, para formar caixa para custear as instalações de interceptores e Estação de Tratamento de Esgoto (ETE).

A partir de então, toda verba arrecadada até aqui só pode ser utilizada para essas obrigações. Senão haveria desvio de finalidade para uso diverso – em específico do percentual destinado ao FMTE. Hoje o caixa acumulado passa de R$ 203 milhões, com rentabilidade mensal de R$ 3 milhões em aplicações financeiras.

Levantamos aqui, na apresentação do PL, que o governo também pode evitar este ponto de insegurança jurídica, estabelecendo o uso já arrecadado para custear a ETE e obras do sistema (usina de energia da estação, unidade para tratar o lodo e emissários para transposição do rio Bauru, etc).

Ocorre que o PL apresentado pelo governo (no texto) inclui a obra da drenagem da Nações Unidas, ao valor de R$ 467 milhões. “Drenagem de águas pluviais não tem qualquer comunicação com construção de sistema de tratamento de esgoto. Embora as duas espécies estejam inseridas dentro do escopo do sistema de saneamento básico, não há qualquer conexão efetiva na execução desses serviços”, opina o consultor.
O parecer posiciona que “ao incluir na outorga sistema de drenagem e permitir a utilização
dos recursos do FTME para custear tal objeto da concessão, nos deparamos com uma pretensão que afronta ao princípio da legalidade, consequentemente,
estamos diante de uma impossibilidade jurídica daquilo que se espera dentro da pretensão legal”, conclui.

Embora o parecer não adentre um pouco mais no item, a questão em debate também suscita que a concessão transfere toda a receita de esgoto do DAE para pagar as obrigações da pretendida concessão. Ou seja, os atuais 60% específicos para operação, investimento e custeio dos serviços de esgoto existentes e, a partir da operação da ETE do Distrito, o acréscimo (passando a tarifa de esgoto a 90%).

LEI FISCAL

Aqui o consultor adentra ao terceiro ponto por ele considerado ilegal do projeto de concessão.

Arildo Lima Júnior pontua que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) exige a apresentação de outras fontes, ou substituição de receita, para o funcionamento do DAE.

O custeio da concessão está ancorado no uso dos atuais 60% (arrecadação global que se soma aos 100% da tarifa de àgua) e mais a diferença (elevação para 90% da tarifa de esgoto a partir do quarto ano, ou entrega da ETE).

A FIPE

Enviamos o parecer para avaliação da Fundação do Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), contratada pelo Município para realizar o estudo da concessão (econômico e jurídico).

Assim que ocorrer o retorno acerca dos três pontos, publicamos. Em audiência pública, profissionais contratados pela FIPE abordaram alguns aspectos em discussão.

Um deles é o de que o marco de saneamento, instituído em lei federal em 2020, inclui drenagem no objeto dos quatro itens do sistema: abastecimento de àgua, lixo, esgoto e drenagem.

Além disso, a FIPE aborda que a enchente da avenida Nações Unidas tem relação direta com a obrigação do futuro concessionário em tratar o esgoto e com níveis de eficiência fixados em contrato.

Assim, as inundações da baixada do Rio Bauru afetam diretamente o cumprimento do serviço, visto, portanto, de forma integrada pela fundação.

Equipe contratada pela FIPE traz advogado Júlio César e economista para estudo da concessão

DIÁLOGO TÉCNICO

Embora a FIPE não tenha ainda respondido os itens do parecer do consultor, o CONTRAPONTO já havia formulado à fundação duas indagações que incluem o diàlogo acima.

Assim, seguem as respostas para o contraditório ao mesmo tempo:

DAS OBRAS

“O objeto principal é a exploração do serviço público de esgotamento sanitário no Município, incluindo a conclusão das obras da ETE. As obrigações complementares, especialmente as obras de drenagem, são relacionadas ao objeto, já que um bom sistema de drenagem é essencial para garantir que a água da chuva não se misture aos efluentes coletados pelo sistema de esgoto. Não é por outra razão que a Lei n. 11.445/2007 define saneamento básico como “o conjunto de serviços públicos, infraestruturas e instalações operacionais” de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e drenagem. São atividades absolutamente interligadas, o que justifica sua inclusão no escopo de um mesmo contrato, a fim de gerar externalidades positivas ao município”, aborda o advogado contratado pela Fipe, Júlio César Moreira Barboza.

Ele acrescenta, a título exemplificativo: “pode-se mencionar que na concessão de água e esgoto no Estado do Rio de Janeiro foram incluídas obrigações relacionadas à operação e manutenção de trechos da rede de drenagem, além da construção de coletores nessas redes (coletor de tempo seco), estrutura respaldada pelos órgãos de controle competentes”.

Sobre o fato da Lei Orgânica de Bauru atribuir ao DAE exclusividade para instalar, operar e gerenciar àgua e esgotamento sanitario, ele comenta:
“A LOM não atribui ao DAE qualquer exclusividade, mas apenas competência, a qual pode ser exercida diretamente ou sob regime de concessão, nos termos do art. 5°, X c/c 91 da LOM. Ademais, o art. 151, que trata da competência do DAE, refere-se ao planejamento dos serviços. O planejamento dos serviços, por sua vez, não será transferido ao concessionário. Logo, o DAE permanecerá exercendo a competência que lhe foi cometida pela LOM, realizando o planejamento e organização dos serviços, que serão executados por terceiro, além da operação dos serviços de abastecimento de água”.

Como mencionado antes, a abordagem não esgota o debate – até porque o parecer aciona outras normas.

Está feito, assim, o ponto de partida para o debate.

Nesta semana, na quarta-feira, DAE e equipe da FIPE realizam reunião técnica sobre o projeto na Assenag e Fiesp.

Quer saber detalhes da proposta, com custos? Leia esta reportagem:

Concessão propõe R$ 1,3 bilhão de retorno em 30 anos para investidor fazer ETE funcionar, construir piscinões e fazer nova Estação de Água (ETA)

 

 

 

6 comentários em “Consultoria jurídica diz que projeto da concessão do esgoto é ilegal ao tirar receitas do DAE e prever uso de verba da ETE para drenagem”

  1. EXCELENTE MATERIA; Entendo que ate presente momento, NAO, se pode transferir qualquer valor arrecadado ou conquistado como um destino especifico; sem uma mudança de uma Lei/ ou projeto desvio de função administrativa e financeira, mas insisto na preocupação dos valores efetivamento investidos na construção parcial, bem como saldo ainda existente com titulo de SALDO de 118 milhoes recebidos a titulos de construção do sistema de tratamento de esgoto, como ficaria esse valor ????

    1. João David Felício

      O DAE tem que investir em drenagem que afeta diretamente o efetivo tratamento de esgoto, ou seja, buscar orientar e se necessário também investir em retirada de águas pluviais lançados por residências nas redes de esgoto que são muitas em BAURU. Sendo o grande responsável por essas irregularidades a Seplan que qdo da liberação de Habite-se não fiscalizam/realizam tais verificação, na verdade na maioria das vezes nem vão as obras verificar para liberação do referido Habite-se. Quando de reforma de um imóvel muito menos se faz qquer fiscalização, ocorrendo aí grande parte das irregularidades. Só para exemplificar, poderia tomar o Residencial Terra Nova com tantas irregularidades em projeto e execução de drenagem irregular e aprovado pela Seplan.

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