O governo de Bauru acaba de publicar 80 questionamentos registrados na consulta pública do edital bilionário da concessão de esgoto e drenagem. E três empresas gigantes do setor questionam um mesmo item crucial: o edital com classificação com risco subjetivo de nota para a técnica (11 itens que vão de descrição geográfica da cidade a conteúdos que envolvem até relatório sobre adensamento urbano).
O alerta levantado pelo CONTRAPONTO é de que a disputa pare nos Tribunais (tanto o TCE quanto o Judiciário). A cidade, com isso, corre o risco de demorar ainda mais para retomar a obra da ETE do Distrito. Mais que isso, o formato de “envelope fechado” elimina a chance do Município atrair dinheiro ao por construtoras de peso em disputa pelo menor preço e outorga (abrindo mão de puxar quem pagar mais pelo contrato de 30 anos). O CONTRAPONTO registrou 5 indagações na consulta pública.
O Município não acolheu as reclamações das empresas do setor e, até aqui, mantém o formato de envelopes e nota técnica para o contrato orçado em R$ 3,6 bilhões.
Veja a seguir o que apontam empresas como Àguas do Brasil, AEGEA e Sabesp/Equatorial.
ÀGUAS DO BRASIL
A empresa Àguas do Brasil, que opera em Jaú, questiona a avaliação subjetiva por proposta técnica. Pede exclusão dessa forma de disputa. O Município rejeita mudar.
Danilo Gabriel de Brito registra que “devido à impossibilidade de um julgamento imparcial, sem qualquer subjetividade e com critérios claros, sugerimos a supressão de proposta técnica”.
A operadora também considera drenagem um ‘corpo estranho’ no edital para tratar esgoto: A Operação, manutenção e reservatório coberto de sistema de retenção de cheias e drenagem urbana foge completamente do objeto de licitação proposta”.
E ela não é a única entre as grandes do setor a defender a disputa por preço (e outorga). O próprio governo do Estado, por meio da Sabesp, é ainda mais incisivo contra o formato de “envelope fechado” do edital de Bauru.
SABESP
Recém privatizada para a Equatorial, através de Marco Seidenberg, a Sabesp posiciona: o objeto colocado em disputa não justifica a adoção do critério de julgamento “técnica e preço”. Em licitações para a concessão dos serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, a adoção do critério “menor tarifa” ou “maior outorga” se mostra potencialmente mais eficiente para o Poder Concedente e para os usuários dos serviços, com ganhos econômicos e financeiros a todos os envolvidos”.
A Sabesp vai além. Acrescenta que “considerando as características do objeto que será contratado e as particularidades do setor – que demandam uma urgente realização de investimentos voltados à universalização dos serviços de saneamento, não há complexidade técnica que justifique a adoção do critério técnica e preço”.
Especializada no setor, a Sabesp/Equatorial alerta que “o entendimento do TCE/SP, em julgamentos relativos a exames prévios de editais, firmou-se no sentido de que ‘ainda que algumas das atividades pretendidas na disputa requeiram a elaboração de projetos de engenharia e a presença de profissionais da área como responsáveis técnicos, tal situação não se mostra suficiente para delinear uma natureza predominantemente intelectual na contratação, notadamente tratando-se de atividades padronizadas no segmento de mercado atuante. Nesse sentido, também no âmbito dos TCs 406.989.23-6, 457.989.23-4 e 580.989.23-4, destaca-se o entendimento do Tribunal de que, ainda que a contratação se enquadre na definição de obras e serviços de grande vulto, a Lei de Licitações exige que o objeto seja majoritariamente dependente de tecnologia sofisticada e de domínio restrito para (se adotar) a adoção da modalidade técnica e preço”.
Ou seja, como adiantou o CONTRAPONTO ao depurar o edital, além de ser subjetivo, o modelo de pontuação estabelecido para Bauru vai emperrar o processo, com impugnações já conhecidas no meio.
DRENAGEM
A Sabesp ainda opina que não se deve misturar concessão de esgoto com drenagem na mesma contratação. Este ponto também já havia sido questionado por especialistas. O governo embutiu obras e custo de operação de piscinões como “contrapartida”. Nenhum edital no País inclui obras contra enchente com serviços de esgoto. A tarifação de obra e operação de drenagem também é especifica. Mas no edital de Bauru, a obrigação está junto com o custo do tratamento de esgoto (valor máximo de 90% de tarifa de esgoto).
MUNICÍPIO DISCORDA
O Município discorda dos questionamentos. Perguntamos ao governo quem assina as respostas na consulta pública. “A análise e as respostas às contribuições foram feitas pela equipe técnica da FIPE”, responde a Prefeitura.
A Fundação é a autora do estudo. A resposta da FIPE, pela Prefeitura, a estes itens é de que “a exigência de Proposta Comercial para a Concorrência é justificada em razão do conhecimento técnico especializado demandado para o adequado desenvolvimento do objeto da Concessão. O projeto envolve o aproveitamento das obras parcialmente concluídas relativas à ETE Vargem Limpa, bem como a proposição de solução para o encargo adicional relativo às obras de drenagem na Av. Nações Unidas, que comporta soluções distintas e para as quais a expertise do prestador deverá ser colocada a teste, a fim de melhor atender ao interesse público do Município. Tendo em vista tais particularidades, entende-se que o critério de menor preço, sozinho, poderá não ser capaz de avaliar adequadamente todos os elementos”.
Outra “grande do setor, a AEGEA se posicionou por Augusto Kiyoshi Nish. A empresa fez inúmeros apontamentos, como sobre o formato de repasses do Fundo de Esgoto para a concessão. São, hoje, cerca de R$ 300 milhões que o vencedor receberá nos 3 primeiros anos – para concluir e fazer funcionar a ETE Distrito.
A AEGEA também frisou posições contrárias a pontuação subjetiva para técnica, por meio de nota, com peso de 70% sobre o resultado. Preço vale 30% na disputa.
O governo atendeu a alguns itens, como o levantado pelo CONTRAPONTO para definir repartição de receitas extras – em 50% para o Municipio e a concessionária.
O Codese de Bauru fez inúmeros apontamentos, detalhando jurisprudências na busca de ajustes no edital bilionário.
A Nova Infrainvest (ex-Odebrecht) pediu prorrogação do prazo em razão da complexidade do edital.
Leia mais aqui: o risco do “envelope” no edital de Bauru